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O candidato

Editorial

1. Em setembro, O INTERIOR fez manchete de primeira página com o título: «Valente sai de cena, Igreja abre a porta» (edição de 6 de setembro). Era a nossa interpretação do que ia acontecendo nos bastidores socialistas da Guarda. Joaquim Valente, obviamente, adiou por algumas semanas a confirmação da sua indisponibilidade e com isso criou um problema ao PS – para não nos dar razão, claro. Confirmada a sua indisponibilidade, «a porta» abria-se para José Igreja. Sexta-feira o advogado foi nomeado (eleito) candidato do PS às próximas eleições autárquicas – três meses depois da nossa manchete.

Cumprindo os estatutos do PS, 94 militantes socialistas concluíram o processo de escolha e eleição do candidato do partido. 94 militantes “elegeram” o próximo presidente da Câmara da Guarda. A conclusão é extemporânea e pode parecer precipitada, todavia, como a história o corrobora, desde 1976, na Guarda, o PS vence independentemente do nome do candidato. Foi assim com os anteriores nomes apresentados a sufrágio e o caminho vai sendo trilhado para a confirmação do domínio socialista (com a ajuda habitual de um PSD em ebulição permanente e um governo de Passos Coelho desastroso)

A escolha de Igreja terá surpreendido os mais distraídos que viam em Virgílio Bento o mais provável candidato à autarquia – tinha conquistado o apoio de todos os interesses instalados na cidade, dentro e fora da autarquia, inclusivamente o apoio suspeito dos até há pouco tempo rivais internos (no PS e na Câmara, como o de Vítor Santos, que inicialmente se perfilou como seu adversário e opositor) e outras ajudas no mínimo estranhas, inclusive nalguma comunicação social local… Não chegou. Ou talvez por tudo isto, os militantes mais jovens e menos alinhados quiseram a mudança, o romper com o “status quo”, com o poder vigente e sucessório. A melhor organização no terreno, com tempo e promessas, deu vantagem a Igreja. Um Bento melhor preparado e trabalhador incansável não conseguiu atrair aqueles que o viam como o responsável pela governação de um concelho de presidente ausente e, por isso, apoiaram a principal promessa de Igreja: a limpeza completa dos que têm ocupado o poder (ou aquele que não tendo comprometimentos com o poder instituído também tem mais margem para ceder a novos poderes…). Veremos.

Entretanto, no PSD, e quando a “vontade” aqui expressa por António Ferreira (O INTERIOR, 29/11/2012) parecia mais próxima – «um combate eleitoral entre José Igreja e Manuel Rodrigues» – a escolha do candidato pode voltar ao principio. De forma inusitada e surpreendente, e quando tudo parecia decidido (por analogia com o que antecipámos para o PS, em setembro fizemos manchete e antecipámos que «Manuel Rodrigues é o candidato do PSD na Guarda»). Passados dois meses, e quando o advogado tinha tudo a favor, parece haver mais dúvidas do que certezas. O candidato a candidato, muito mal rodeado, ainda não conseguiu impor-se e não conseguiu que à sua volta se criasse uma aréola de predestinado (ou pelo menos de “escolhido”). E se o mais provável candidato ainda é Manuel Rodrigues, em surdina já é o nome de Álvaro Amaro que se ouve.

O PS parte mais uma vez em clara vantagem: tinha dois candidatos, escolhe um e vê os seus adversários regressarem à habitual atitude autofágica.

2. Precisamente quando assistimos ao encerramento (notável) da Capital da Cultura em Guimarães, o CA da Casa da Música demite-se contestando o corte de 30 por cento no apoio concedido pelo Estado português. Mesmo em tempo de crise e dificuldades há mínimos! A redução em 20 por cento, que tinha sido anteriormente anunciada, já ia muito para além do ajustamento que a todos é pedido, mas de um momento para o outro impor um corte desta dimensão é pôr em causa, não apenas a atividade cultural de uma das mais relevantes instituições do país, mas inclusive o normal funcionamento da Casa da Música. Esta opção vai muito para além de uma política de austeridade, é um ultraje e um mau exemplo para o futuro do país.

Luis Baptista-Martins

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