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No caminho da descentralização

Editorial

A afirmação de que Portugal é um país com diferentes velocidades ou que somos um país “inclinado” para o mar, são expressões assumidas e aceites como “normais”, quando na verdade deviam ser premissas de intervenção político-administrativa que implicassem alteração ao modelo de desenvolvimento nacional. Os governos portugueses, de forma sucessiva e independentemente da cor partidária, manifestam-se em Bruxelas pela coesão europeia e pelo combate à periferização, mas, depois, na gestão do território, fazem precisamente o contrário: promovem as assimetrias e a interioridade. A correção de assimetrias ou a defesa da «coesão nacional» são expressões que fazem parte do léxico político e partidário há muitos anos, mas as reformas que possam inverter a tendência e dar um novo rumo ao desenvolvimento do país como um todo, continuam a ser sucessivamente adiadas.

Estes pressupostos deviam conduzir-nos a uma atitude de exigência de mudança, mas, infelizmente, para além da lamúria eleitoral quando há eleições, ninguém se movimenta em prol de uma metamorfose político-administrativa. A regionalização ou outra forma de reorganização do território são a única esperança de que alguma coisa possa ser feita para mudar o mapa do subdesenvolvimento do interior. Mesmo que não tenhamos dúvidas de que qualquer forma de regionalização implicará mais despesa pública, “mais lugares para os mesmos”, mais regabofe com o dinheiro público, e sem grande ilusão sobre a qualidade dos protagonistas, só havendo um caminho de poderes regionais, de poderes de decisão intermédios, será possível alterar o mapa centralizador do país.

Já a pensar na negociação do próximo quadro comunitário, que se inicia em 2018, e com o novo modelo de descentralização definido, para que o país se apresente em Bruxelas com “coerência territorial” e querendo contrariar a atual opacidade na gestão do território. O programa do governo prevê que o órgão de gestão das CCDR seja eleito por um colégio eleitoral formado pelos membros das câmaras e das assembleias municipais (incluindo os presidentes de juntas de freguesia) da área de intervenção de cada comissão. Nas duas áreas metropolitanas (AM) de Lisboa e Porto, “para reforçar a sua legitimidade”, tanto a assembleia metropolitana como o presidente da AM passam a ser eleitos pelos cidadãos, nas eleições autárquicas (as próximas são no Outono do próximo ano). Além disso, as assembleias municipais terão os seus poderes de fiscalização política reforçados. Ou seja, a mudança de paradigma pode iniciar-se já no fim do ano e, no que concerne à nossa região, a liderança da CCDRC, até agora nomeada pelo poder central, deverá passar a emanar do voto entre autarcas do Centro. Neste contexto, já se vislumbram putativos candidatos à liderança regional. Em Coimbra, os socialistas apostam que Manuel Machado, atual presidente da Câmara, será o primeiro presidente do Centro. E do lado do PSD, Álvaro Amaro e Almeida Henriques (Viseu) poderão disputar o lugar de candidatos à presidência (interpares) da região plano. Parece que ainda falta muito, mas tudo poderá começar já no final do ano ou pelo menos em 2017. Poderá ser uma caminho para mudar alguma coisa ficando tudo na mesma: com mais “taxos”, compadrio e oportunismo partidário (veja-se o que sucede na CIM). Ou poderá ser o ponto de partida para acabar com a opacidade das CCDR e iniciar uma viragem no modelo de organização e desenvolvimento do território.

PS: Esta semana avançou o abate massivo das árvores da Av. Cidade de Salamanca, na Guarda. Parece que muita gente não gostava da sombra, da humidade, da dimensão ou do desempenho do conjunto arbóreo da avenida. Gente que não aprecia a natureza, o meio ambiente ou a qualidade do ar; gente que não respeita a Natureza; gente que não respeita os afetos, as tradições ou a cultura e a civilidade de uma cidade. Gente que manda abater árvores porque não respeita nada… Noutras cidades melhoram-se os corredores verdes e plantam-se árvores, na Guarda abatem-se em nome de uma suposta melhoria da qualidade arbórea, de salubridade ou conforto climático. Pobre cidade… que fica à espera da plantação de duas mil novas árvores.

Luis Baptista-Martins

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