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Muito grau, pouca uva

Vinho da região vai ser de melhor qualidade, apesar do decréscimo na produção

Depois da campanha vitivinícola tudo indica que a colheita deste ano se traduzirá numa produção de pouco, mas bom vinho. Segundo as previsões do Instituto Nacional de Estatística (INE), a produtividade da uva para vinho em Portugal deverá crescer cinco por cento. Já o Instituto da Vinha e do Vinho (IVV) prevê um decréscimo de dez por cento na produção vinícola da região. Para alguns produtores, 2004 é um ano de bom vinho com bons teores alcoólicos, mas com pouca uva.

José Nunes, vice-presidente da Adega Cooperativa de Figueira de Castelo Rodrigo, afirma que as vindimas correram este ano «muito acima da média», graças provavelmente às boas condições climatéricas que se fizeram sentir. Por isso a produção de vinho esperada é de «excelente qualidade», diz José Nunes, acrescentando que «não há memória de uma colheita assim». Até os próprios funcionários da cooperativa, alguns deles com mais de 30 anos de casa, «não se lembram de uma vindima como esta», sublinha aquele responsável, apesar de se ter registado um ligeiro decréscimo de cerca de meio milhão de quilos de uvas comparativamente ao ano passado. Este ano «só» chegou à Adega figueirense cerca de 11 milhões de quilos, lamenta José Nunes. Mau grado esta diminuição da produção, ela não tem influência na qualidade do vinho produzido, pois «temos mostos muito bons», destaca o responsável. Este cenário deve-se «ao calor em demasia», particularmente na primeira quinzena de Setembro, «logo houve pouca humidade para as uvas este ano».

Em Pinhel também se perspectiva um bom ano, «apesar da diminuição de cerca de um milhão de quilos de uvas» em relação à colheita de 2003, assegura António Morgado, presidente da Adega Cooperativa. Admitindo que ainda é cedo para avaliar a qualidade do vinho, que neste momento está na fase de fermentação, aquele responsável arrisca dizer que, no cômputo geral, «as uvas chegaram em razoáveis condições e tudo leva a crer que vai haver bom vinho». O teor alcoólico, que normalmente se situa entre os 12 e os 13 graus, também não será afectado pela diminuição da produção. Para António Morgado, a melhor qualidade está associada a vários factores, nomeadamente à reconversão das vinhas por parte dos associados, «eliminando as piores castas, o que se traduz em melhor vinho em termos de cor e aroma». Mas também está relacionada com o menor índice de humidade a que as uvas estiveram sujeitas. Contudo, o problema surge na comercialização do vinho, «que não é uma tarefa fácil, pois é cada vez mais difícil encontrar mercado», queixa-se aquele responsável.

Vinho «quase ecológico» na Mêda

Já a Adega Cooperativa do Fundão vive bons momentos. A produção deste ano foi superior à de 2003, cerca de mais dez por cento. Por isso, António Madaleno, enólogo da Adega, assegura que a qualidade também «vai ser boa». Este ano produziu-se cerca de 4,4 milhões de quilos de uvas, «que é um aumento substancial», reconhece o técnico, acrescentando que tal se deve à ligeira quebra do ano passado, mas também às reservas das videiras e à revitalização das vinhas apoiadas pelos fundos comunitários. Neste momento há cerca de 350 hectares de vinhas em fase de renovação, «um número muito significativo», constata o enólogo. A adega fundanense é conhecida pelos altos teores alcoólicos dos seus vinhos, que rondam os 13 e 14 graus, e este ano não vai ser excepção, garante. Do outro lado da região vitivinícola, Luís Nogueira, director da Adega Adega Cooperativa Beira Serra, em Vila Franca das Naves (Trancoso), também espera uma qualidade da produção «muito superior». O mesmo já não pode dizer em relação à quantidade, dada a quebra «entre os 20 e 25 por cento» verificada.

No entanto, a colheita decorreu dentro da normalidade, mas com uma quantidade de uvas muito inferior à expectativa, já que só entraram «cerca de dois milhões de quilos de uvas» na cooperativa vilafranquense. Facto que, segundo Luís Nogueira, poderá estar relacionado com um período de temperatura atmosférica quente e seca. «Mas o grau é melhor», garante. Na Mêda também houve menos uvas que nos outros anos. «Sentiu-se um decréscimo de dez por cento», adianta Ricardo Lopes, chefe de serviço da Adega, apontando como causa principal as condições climatéricas. «Foi um ano de pouca chuva», refere, logo as uvas chegaram «em melhor estado», cerca de 2,6 milhões de quilos e com um grau médio de 12,80. Neste momento encontram-se na fase malolática, ou seja, de fermentação. A Cooperativa da Mêda espera produzir cerca de 830 pipas de vinho do Porto e 2.630 de vinho de consumo. De resto, «a qualidade do vinho é superior», porque há menos tratamentos, logo menos produtos químicos, revela Ricardo Lopes, para quem este ano o vinho «é quase ecológico».

Patrícia Correia

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