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Maternidade da Guarda na “lista negra”

Apesar dos protestos dos clínicos do Centro de Saúde e do Conselho Distrital da Ordem dos Médicos

Desde a semana passada que está nas mãos do ministro da Saúde o estudo que aponta para a necessidade de encerramento de mais de um quinto das cerca de 50 maternidades dos hospitais portugueses. Na “lista negra” encontram-se as maternidades da Guarda e Castelo Branco, apontadas como as mais consensuais, cujos partos podem vir a ser concentrados no Hospital da Covilhã.

A decisão deverá ser tomada no final de Novembro, altura em que Luís Filipe Pereira vai reunir-se de novo com os elementos da Comissão de Saúde Materna e Neonatal, o grupo de especialistas que durante vários meses procedeu ao inventário da situação a nível nacional. Depois do levantamento das condições das urgências obstétricas em Portugal (número de partos/ano, número de obstretas ginecologistas e enfermeiros, distâncias entre as maternidades, entre outros dados), o estudo aponta para a necessidade de encerrar mais de dez serviços. Os casos de Santo Tirso, Barcelos, Mirandela e Amarante serão consensuais, o mesmo acontecendo com a Guarda e Castelo Branco. Porém a média anual de partos não vai ser o único factor a pesar na decisão final de fecho dos serviços. Se assim fosse, na região da Beira Interior o último a fechar seria o da Guarda. Seja como for, o ministro da Saúde admitiu que qualquer decisão não deverá avançar antes do final do primeiro trimestre de 2005, sendo que o processo vai ser gradual, com o encerramento de apenas uma ou duas maternidades, numa primeira fase.

Quem já luta para que tal não venha a concretizar-se são os médicos. A começar pelo Conselho Distrital da Ordem dos Médicos, que manifestou o seu desagrado pelas declarações do Bastonário da Ordem dos Médicos, Germano de Sousa, há cerca de dois meses na Covilhã, anunciando o possível fecho da maternidade da Guarda. Estas revelações estiveram na origem de uma reunião e da «notificação imediata da entidade em causa», esclarece Reis Pereira, responsável distrital. Entre as várias questões colocadas na carta a Germano de Sousa estava a solicitação de «esclarecimentos e eventuais argumentos» que justificassem o encerramento da maternidade da Guarda. Os médicos questionaram também o Bastonário sobre «se aquela era uma posição enquanto cidadão ou Bastonário». Contudo, o Conselho Distrital da Ordem dos Médicos ainda não obteve respostas e se essa situação persistir até hoje, Reis Pereira garante que divulga o conteúdo da carta nos órgãos de comunicação social. De resto, o médico considera «estranho» que os obstretas da Guarda «ainda não se tenham feito ouvir, nem manifestado contra esta medida anunciada». Um lamento que também abrange as forças políticas locais, que «estão silenciadas», refere.

O que não é o caso do Conselho Distrital da Ordem dos Médicos, que «está atento porque também é a nossa obrigação», assegura o dirigente. E depois daquela diligência, outras virão, embora acredite que a maternidade pode mesmo encerrar, «infelizmente». «Há cerca de 25 anos os partos eram feitos na Covilhã ou em Coimbra, pelo que, se esta medida for avante, há um retrocesso e a história repete-se», denuncia Reis Pereira. Também os médicos do Centro de Saúde da Guarda se juntaram pela mesma luta. Depois de uma reunião no dia 12 de Outubro foi decidido por unanimidade manifestar aos superiores hierárquicos e à população em geral, algumas das interrogações mais pertinentes e para as quais não encontraram resposta. Tal como «o porquê da transferência da maternidade onde mais consultas e partos se fazem por ano para outra onde se realizam menos? Não deveria ser o contrário?», questionam. Segundo estes médicos, mais de 50 por cento das grávidas são vigiadas nos Centros de Saúde e necessitam de se deslocar às maternidades pelo menos quatro vezes antes do parto, enquanto as que são vigiadas no próprio hospital necessitam de pelo menos uma consulta por mês durante a gravidez nessas mesmas maternidades. «Será que este volume de deslocações (da Guarda e de Castelo Branco para a Covilhã) está já a ser contabilizado como rendimento das futuras portagens da A23?», interrogam os médicos.

Presidente da ARS invoca qualidade da Guarda para maternidade não fechar

A maternidade da Guarda não vai fechar enquanto continuar a garantir a prestação de serviços de qualidade na assistência a parturientes e recém-nascidos. A garantia foi deixada em Outubro por Fernando Andrade, presidente da Administração Regional de Saúde (ARS) do Centro. «O serviço é de qualidade, pelo que não está em causa o seu encerramento por enquanto», sublinhou aquele responsável, deixando, contudo, entender que o “fio” que segura a maternidade do Hospital Sousa Martins é muito ténue e pode “quebrar-se” a qualquer momento. Bastará, por exemplo, que algum dos clínicos que ali trabalham actualmente decida sair. Fernando Andrade ressalva que a questão que se coloca nesta matéria é nascer bem e em situação segura para a mãe e a criança. «A maternidade da Guarda não tem 1.500 partos, mas tem qualidade na assistência que presta no parto e pós-parto, tem pediatra à cabeceira do recém-nascido e portanto não se põe a questão de fechar uma maternidade que tem essa qualidade», adiantou, sublinhando que aquela especialidade presta «hoje bons serviços quer de maternidade e de assistência aos recém-nascidos, e é essa nossa preocupação, pelo que não está em causa o seu encerramento por enquanto».

Patrícia Correia

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