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Futebol TV

Por vezes nem é preciso entrar num café para saber o que se passa lá dentro. Basta ler os sinais. Se o leitor passar junto a um café e vislumbrar um conjunto de clientes a olharem todos na mesma direcção, é mais do que provável que esteja a ser transmitido um jogo de futebol na televisão. Esta catarse à volta dos jogos televisionados (a raiar o absurdo) acentuou-se de há uns tempos a esta parte com a entrada em cena das televisões pagas (os canais dos ricos como já ouvi alguém definir) e cresceu com a loucura dos jogos de Portugal no Europeu. Hoje as pessoas ficam literalmente pregadas, coladas ao ecrã a ver as faltas, os cartões amarelos e vermelhos, as caneladas e as rasteiras, os fora-de-jogo, e como se não bastasse as sucessivas repetições das jogadas. Há uma certa alienação neste tipo de comportamentos e o pior é que os estabelecimentos hoteleiros até já deram conta das preferências dos clientes. Há bares que têm três ou mais televisões estrategicamente situadas de modo a facilitar o ângulo de visão de cada freguês. Há outros que instalam televisores de grande tamanho ou mesmo autênticas telas de cinema. Tudo em prol do bem-estar do cliente, para que ele não perca uma pitada. Será assim que se conquistam e fidelizam consumidores? Não sei se tudo isto é moda ou se estaremos ainda numa fase de potencial crescimento do fenómeno. Mas que começa a incomodar, lá isso começa. Poderia pensar-se que tal adoração pela matéria fosse sinónimo de amor e gosto pelo jogo. Mas então porque se vêm tão poucos adeptos nos campos de jogos. Porque é que as assistências mesmo na primeira Liga não ultrapassam os cinco mil espectadores? Parece um contra-senso mas é verdade. Em Portugal são poucos os que vão ver jogos ao vivo. Ainda agora, na Guarda, tivemos a prova disso mesmo. Numa iniciativa que juntou três clubes da cidade, o Mileu, o NDS e o novel Guarda, parece que a assistência rondou tão-somente trezentas pessoas. Muito pouco se tivermos em conta a quantidade de gente que se junta nos cafés para observarem os jogos televisionados. É difícil de compreender mas é mesmo assim. Talvez seja a clubite aguda o que motiva tanto interesse pelos jogos na TV (vêem-se os do clube preferido para ver se se ganha e os dos rivais para ver se estes perdem). O que sei é que longe vão os tempos em que o estádio municipal registava autênticas enchentes para ver a equipa local jogar. Agora o futebol entra pela casa dentro e as pessoas preferem o conforto de uma cadeira (e a respectiva cervejinha a acompanhar). Pensando um pouco no assunto, e porque me recuso a aceitar este cenário como uma inevitabilidade, dou comigo a delinear duas estratégias para fazer inverter o rumo da situação. E fazer com que as pessoas regressem aos campos e ao amor ao clube da sua terra. A primeira seria a de desenvolver campanhas de divulgação e de sensibilização para levar as pessoas a assistir aos jogos. Até se poderiam oferecer uns prémios pela ida ao estádio além da não cobrança de bilhete. A segunda (se Maomé não vai à montanha…) seria a de criar uma televisão local e transmitir os jogos em directo e em canal fechado (o clube ganharia ao vender os direitos de transmissão). Tudo junto talvez alterasse o estado das coisas.

Por: Fernando Badana

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