1. A candidatura “Guarda em Primeiro”, um projecto de perfil independente patrocinado pelo CDS-PP, apresentou-se ao público e à imprensa no dia 24! Ficou claro, para quem esteve atento, que este projecto não nasceu da teimosia, mas da determinação. Veio preencher um vazio nas propostas em confronto e, ao mesmo tempo, criar o seu próprio espaço. E é legítimo acreditar que o seu simples aparecimento pode iniciar um processo que culmine na obsolescência de uma certa maneira de estar na vida pública. Sem euforias, ou canduras despropositadas. E, sobretudo, sem cair na tentação de agitar elixires e panaceias. Após o acumular de tarefas e de cuidados de toda a espécie, comuns à gestação de qualquer projecto colectivo, torná-lo público tem o sabor de um anti clímax. Porque a atracção pelo segredo é tão forte como o alívio em nos vermos livre dele. Psicologia básica, que o senhor Zuckerberg soube explorar como ninguém. E que tornou o direito ao segredo pouco mais do que uma reivindicação juvenil. Cedo transformada, nos mais sagazes, num direito ao esquecimento. Na política, a informação é um valor de uso e de troca. Valor para quem dela pode dispor e valor em si mesmo. A candidatura: podia ser de outra maneira? Podia, mas não era tão importante. O apego ao que sentimos como o nosso espaço referencial é tão igual agora como era há 500 anos. Defendê-lo continua a ser uma questão de sobrevivência e de identidade. Só o sentido da empreitada mudou consideravelmente. Hoje, a batalha não é entre territórios que olham entre si com avidez, mas entre concepções do uso do poder. E o poder autárquico tem uma relação de proximidade com a realidade que não é só física. Que vai para além da gestão corrente dos recursos postos à sua disposição. Na Guarda, está a acontecer algo nunca visto. Acabaram as trincheiras clássicas e as arrumações políticas canónicas. Mas nem por isso acabaram as que têm como única razão a conveniência pessoal e a expectativa de empregabilidade. E são essas as únicas que hoje subsistem. E é nelas que os diferentes contendores se escondem, mostrando-se, e se mostram, escondendo-se. Não obstante, uma nova estirpe irrompeu: os que vêm a terreiro alheados dessa dança de cadeiras, passando ao que realmente interessa para a polis. Podia ser de outra maneira? Podia, mas não era tão sexy.
2. O komentariado oficial já deu de barato que, por terras gaulesas, o senhor Macron irá passar a perninha a Marinne Le Pen, no dia 7 de Maio. Entretanto, aquém e além Atlântico, os mesmos media que ridicularizam Trump fazem agora o mesmo com a candidata da FN. A coisa não prenuncia nada de bom. É certo que a segunda volta das eleições francesas terá o maior day after de que há memória na V República. E a Europa está suspensa dos seus resultados. Todavia, para muitos franceses, o programa social e económico de Le Pen não é assim tão diferente do senhor Melanchon. E quem lida diariamente com os efeitos perversos do “multiculturalismo” e com o terror jihadista são os franceses comuns, de Calais a Nice. Não são os jornalistas, intelectuais e activistas progressistas que vivem nos seus bairros exclusivos de Paris, Londres, ou Nova Iorque. Se a intenção é impedir a vitória de uma candidata que irá subverter o regime, a melhor estratégia não é, seguramente, agitar papões ao eleitorado, mas retirar-lhe os motivos para ter medo.
3.”Deviam era ir todos presos!”, é a frase de eleição do tuga médio. O passe de mágica de que precisa para mostrar que está zangado com o mundo e quer nele repor uma ordem simples e tranquilizadora. Pois sabe que as consequências da sua proclamação serão nenhumas. No fundo, é a sua declaração de impotência, mascarada de uma virilidade justiceira. E fá-lo. agitando, eufórico, alguns castigos exemplares infligidos a banqueiros na ignota Islândia. O tuga médio nunca diz: “fulano, sicrano e beltrano deviam ir presos por isto, isto e mais isto!” Não! Para quê encarcerar indivíduos, quando se pode encarcerar uma espécie: os políticos, os banqueiros, os corruptos, os especuladores, os motoristas da Uber, os pensionistas que ganham mais de três mil euros, etc. Prisões a abarrotar é que era! Tudo o que for a menos é sinal de fraqueza. O tuga médio acha prestigiante fugir ao fisco. Mas não suporta que alguém fuja com mais requinte. E ainda por cima, sem fazer disso segredo. O tuga médio é temível! Se mandasse, haviam de ver como isto piava fino! Sábios têm sido os políticos, que nunca deram demasiado poder ao tuga médio! Sim! Basta ter tempo de antena suficiente para explicar, sucinta e impressivamente, quais os castigos que infligiria aos malfeitores do costume, caso detivesse esse poder!… Declarações prestadas frente às câmaras e microfones, à cautela, em período happy hour. Não vá o diabo tecê-las…
Por: António Godinho Gil