P – Que balanço faz destes 30 anos da Associação de Jogos Tradicionais da Guarda?
R- Pode ser visto pela quantidade de actividades que se desenvolvem um pouco por todo o distrito, em torno das práticas lúdicas tradicionais. Rara é a festa ou a aldeia que não tem o seu torneio de jogos tradicionais. Por aí, penso que o balanço é muito positivo. Aliás, o facto de ter sido pioneira levou a que no distrito da Guarda se pratiquem jogos que praticamente não se praticam noutro ponto do país, como a raiola, o panco ou a luta de tracção com corda.
P – Qual a prenda que desejaria receber neste aniversário?
R – Pelo trabalho desenvolvido, a associação e a população da Guarda merecem ter um museu do jogo. Esta era a prenda que gostaria que a associação pudesse ter. Não que lhe fosse oferecido, mas que a associação pudesse ver reconhecido o seu trabalho no âmbito da recolha e no empenho que tem posto na construção de brinquedos. Este projecto já tem teias de aranha. Estamos a tentar arranjar apoios, porque não é um projecto que se compadeça com amadorismos, mas penso que o espólio que já conseguimos reunir merecia ser visto e disponibilizado às pessoas. Era importante que pudesse ser criado um museu em que as peças fossem apenas museológicas, mas que em simultâneo fosse um museu activo e que permitisse, por exemplo, às crianças contactarem com jogos num espaço onde fosse possível brincar.
P – Mas o que é que falta, em concreto, para que esse projecto se concretize?
R – Falta vontade política. Não é uma crítica a nenhuma instituição em especial, mas este adiamento é o resultado de uma aposta que os sucessivos governos têm vindo a fazer, de privilegiar o desporto de alto rendimento. O desporto de recriação foi progressivamente sendo ostracizado, sobretudo a partir do início da década de 90. Parece ter sido uma opção estratégica, que esqueceu que, sobretudo aqui no interior, algumas das nossas populações praticam essencialmente jogos tradicionais. Penso que é a altura de se olhar este tipo de intervenção social como uma possibilidade de travar o esvaziamento das aldeias. Se for possível os jogos tradicionais servirem para “viciar” os jovens, penso estarmos a cumprir o nosso grande objectivo.
P – Os jogos tradicionais continuam a ter muitos praticantes na região?
R – Menos do que já tivemos, mas mais do que seria espectável em função do esvaziamento do Interior. Hoje é impensável realizar-se uma actividade com o impacto que teria há 20 anos, pela desertificação e porque há “concorrência desleal” por parte de outros desportos. É hoje muito mais agradável a um adolescente poder praticar BTT ou escalada – porque estão na moda, como já estiveram os jogos tradicionais nas décadas de 80 e 90 –, do que estar uma tarde a jogar à malha. No entanto, continuam a desenvolver-se grandes actividades ligadas aos jogos tradicionais. Mas o que mais nos interessa não é que haja uma grande actividade, mas que haja centenas de pequenas actividades. Actualmente, o plano de actividades da associação contempla mais de 100 por ano, a decorrer entre Março e Outubro.
P – Que argumentos utilizaria para atrair um jovem do século XXI a praticar jogos tradicionais?
R – Há muitas formas de os atrair. Uma delas passa pela inclusão na escola de uma verdadeira disciplina de formação cívica. Quando se inclui, num programa escolar, uma disciplina de formação cívica, mas não se permite que nessa disciplina haja uma componente regional, em que cada região pudesse motivar os seus jovens para a recuperação das suas tradições, e quando um jovem de uma aldeia já não sabe o que é um arado ou uma charrua, é porque as coisas não estão a correr bem.