O Inverno, cinzento, frio e chuvoso, chegou, e com ele as habituais gripes. Aqui no Corta! o fim-de-semana prolongado, de tantos planos, foi passado na cama. Por companhia, na impossibilidade de uma deslocação às salas de cinema, a salvação chegou do clube de vídeo. Uma mão cheia de filmes que tinham por missão fazer esquecer o mal-estar provocado pela doença. Missão quase totalmente falhada, avanço desde já, pelo que, aquilo que se segue, mais que um guia pelos filmes a levar para casa, é mais uma lista dos filmes a evitar.
Comecemos pelo melhor, pois se, no final, já não houver espaço para mais, que se deixe de falar dos que menos interessam. E o menos mau de todos acabou por ser The Station Agent – A Estação, o filme que tantas simpatias angariou aquando da sua passagem por Sundance. Um anão, uma cinquentona e um fala-barato fazem o trio deste filme, banhado num espírito independente, feito por e para amantes de comboios. Durante hora e meia nada acontece, e o que poderia irritar acaba por se revelar de uma simpatia desarmante.
Num registo mais acelerado, a dever muito ao território televisivo, na montagem, ritmo e organização narrativa, Narc relata a busca pela verdade de dois polícias que tentam descobrir quem matou um colega de profissão. Muito espalhafato e uma mão cheia de boas intenções (veja-se a entrevista com o realizador, incluída no dvd) não apagam a sua previsibilidade. Quem, em 15 minutos, não souber logo quem foi o culpado, não deve ter visto, em toda a sua vida, mais que 10 filmes. E o twist final nem conta, nem chega para a salvação.
Outro filme indie americano de difícil definição e classificação é The Cooler – Má Sorte. Com o sempre fabuloso William H. Macy e a escaldante Monica Bello, também aqui pouco acontece. Um azarado que trabalha num casino, espalhando a sua má sorte por todos os que estejam a passar por uma maré de sorte no casino onde trabalha, perde o seu sustento ao apaixonar-se. Se o ponto de partida já não é grande coisa, o que com ele é feito é ainda mais confrangedor. De nada em nada até ao vazio final.
Depois do interessante Twin Falls Idaho – Vida Comum, ovni de há uns anos atrás que chegou a aterrar nalgumas salas nacionais, a fazer lembrar o universo de Lynch, a última proposta dos irmãos Polish é, mais que um filme, um poema em forma de fábula, de belas imagens mas conteúdo indecifrável, demasiado enigmático para que algo nele se encontre. Eles falam em transição e mudança, mas esqueceram-se de fornecer o mapa que possibilite descodificar tal. Talvez o problema seja mesmo da gripe, mas Northfork mais valia ter ficado submerso nas águas que assombram todo o filme e que se preparam para inundar a terriola com o mesmo nome.
Mas, se os atrás referidos são fracos, o pior mesmo é The Missing – Desaparecidas. Convém desde já dizer que a paixão do Corta! por realizadores como Kubrick, Wilder, Lynch ou Kazan (para nomear apenas alguns) só tem comparação com a antipatia por uma pessoa como Ron Howard (chamar-lhe realizador seria um sacrilégio). Em Desaparecidas este tipo não faz a mínima ideia daquilo que está para ali a fazer. Não há um único momento que crie entusiasmo e a partir de certa altura já nem interessa saber se as jovens raptadas serão salvas ou não. Pessoas como Ron Howard deveriam ser proibidas de fazer cinema. Claro que o que ele faz não é cinema, mas pode haver pessoas que julguem que sim, e isso é um problema. Vejam The Searchers – A Desaparecida, de John Ford, e descubram as diferenças. Se o objectivo era copiar mais valia ter estado quieto. Enfim, e pensar que tal idiota já ganhou um óscar.
Por: Hugo Sousa
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