Não sou dos que acham que se é melhor ou pior pessoa por se ser de esquerda ou de direita. Nem dos que julgam que as más intenções são exclusivo de uns apenas. Ou as boas intenções. Ou o progresso social. Ou a justiça social. O bem comum. Um futuro melhor. Com maior ou menor dificuldade, tudo isto e o seu contrário se encontra à esquerda como à direita. Um mínimo de seriedade devia bastar para desmontar ilusões que num instante nos devolvem o pior, por vezes dentro de nós mesmos.
Mas também não sou dos que acham que esquerda e direita são a mesma coisa e que, portanto, mais vale partir para outra. Nem daqueles que, pelo contrário, pensam que esquerda e direita são as duas peças de um dispositivo que precisa de ambas para funcionar bem. Uma espécie de dispositivo mental coletivo para arrumarmos as questões políticas em duas respostas diferentes. Embora pareçam contrárias – eu mesmo disse “pelo contrário” – no fundo estas são apenas duas maneiras de chegar a um mesmo resultado. É só escolher como queremos chegar lá: ou mantendo a diferença entre esquerda e direita, tornando-a no entanto uma funcionalidade naturalizada do sistema; ou dispensando-a de vez. Com ou sem diferença, o resultado é o mesmo: elide-se a sua oposição política. E com isso mata-se a política. Daí em diante apenas se administra o sistema. Resolvem-se problemas, mas nada se transforma.
Esquerda e direita não são a mesma coisa, pensam coisas diferentes. Mais importante: pensam coisas opostas. E, por isso, entre as coisas que pensam, uma é central: a de que os outros estão, em última análise, errados ou, ao menos, a ver mal. A pretensão aqui não é pretensiosa nem sectária nem tribal. É mesmo o único motivo honesto para tomar partido.
A hipótese da Direita é pelo menos uma de duas: ou a da desigualdade justa, seja por natureza seja adquirida, ou a da incapacidade de produzirmos humanamente transformações que não tragam mais malefícios do que benefícios. A hipótese da Esquerda é uma conjugação de duas: a igualdade de princípio entre os homens e a capacidade de produzirmos transformações no mundo social que o tornem mais conforme com essa igualdade. A exigência desta conta a favor daquela, mas conta também pelo que vale a pena.
Hoje temos um governo de esquerda em Portugal, com uma clara pretensão a fazer alternativa e não mera alternância. Não apenas fazer diferença, mas fazer diferente, até o oposto. Para isso não basta fiarem-se na experiência política. É preciso cultura política, de novo a cultura política das grandes escolhas que valem a pena, das grandes escolhas que nos quiseram subtrair.
Por: André Barata