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«Colocar portagens na A23 é um dos golpes mais profundos de que há memória na região»

Cara a Cara – Entrevista

P-O último protesto da Comissão de Utentes da Auto-Estrada da Beira Interior teve uma grande adesão. Isso é sinónimo de que a região está mesmo contra as portagens na A23?

R- É sinónimo de que o protesto começa a consolidar-se e a ganhar cada vez mais apoios. Só para dar um exemplo, já devemos ultrapassar as seis mil assinaturas em pouco mais de 15 dias. Quanto ao protesto na rua, este foi um bom começo.

P-Haverá então mais manifestações?

R-Vai ter que haver mais e cada vez com mais intensidade. O Governo só irá recuar se de facto as pessoas se manifestarem publicamente contra as portagens. Não vejo este Governo a ter uma sensibilidade diferente apenas com as posições institucionais dos cidadãos. O Governo está obcecado com uma política de captação de receita a todo o custo e dificilmente vai ceder, a não ser através de acções de protesto e de descontentamento das populações.

P-Mas apesar dos protestos e das assinaturas que já recolheram, acha que o Governo irá recuar?

R-Não era a primeira vez que um Governo decidia recuar. Acho que um Governo democrático não pode exclusivamente tomar uma decisão baseada numa maioria da Assembleia da República e publicá-la. Do ponto de vista político, acho que é um erro e uma afronta absurda aos cidadãos. Se não se tem em conta a vontade e as razões de uma região, é um Governo que está completamente autista e que não atende o povo.

P-Na sua opinião, esta é mesmo uma má decisão para a região?

R-É uma péssima decisão e acho que esta medida é um dos golpes mais profundos de que há memória na região. As pessoas sabem que esta medida poderá ser trágica e que vai ter consequências muito negativas na Beira Interior. Podíamos dizer que isto era uma posição política, mas não se trata disso. O protesto é genuíno e baseado naquilo que serão as consequências futuras da introdução de portagens na A23.

P-Acha então que as condições sociais e económicas da região vão agravar-se com a introdução de portagens?

R-Isso é confirmado por empresários e autarcas. A A23 não é apenas uma auto-estrada ou uma acessibilidade, é muito mais do que isso. Fomos das últimas regiões do país a ver concluídas as infraestruturas rodoviárias. A A23 é um instrumento decisivo para poder alavancar o desenvolvimento da região, para além de ter permitido um contacto muito maior entre populações que estavam há uns anos praticamente de costas voltadas porque as acessibilidades eram muito difíceis.

P-Mesmo com a promessa de isenções para moradores e as empresas da região?

R-A única alternativa é o actual quadro: sem portagens. Essa isenção é temporária. Acho extraordinário que o ministro, o Governo e os autarcas do PSD que são favoráveis às portagens considerem a isenção um ganho. Não é um ganho, mas uma perda. O que faz sentido é manter a auto-estrada tal como foi garantida pelo Decreto-Lei da concessão e como foi prometida por Durão Barroso e Carmona Rodrigues. Esta é uma boa acessibilidade e é fundamental que se mantenha tal como está.

P-Acha que deveria haver um maior apoio dos autarcas da região?

R-A maioria dos autarcas da região são contra a introdução de portagens. No entanto, é preciso que eles se envolvam no buzinão. Os que estão hoje conformados com a introdução de portagens por causa da isenção já estão assim desde o início, como é o caso da Covilhã e do Fundão. Esperamos o apoio de todos os que discordam desta medida, mas não acredito que a Covilhã mude a sua posição. Não posso aceitar que o ministro venha dizer “tome lá o IC6 e a variante à Covilhã, mas pouco barulho contra as portagens”. Corremos o risco de ver o Algarve a manifestar-se em peso e unido contra as portagens e nós termos na região cidades e autarcas, com peso político, que parecem satisfeitos. Há que colocar em primeiro lugar os interesses e as necessidades da região. Não o fazendo, estão a contribuir para o Governo dizer que há autarcas solidários com a medida. Não é por acaso que a Covilhã e o Fundão chumbaram a moção contra as portagens, mas isso é claramente uma posição política e oportunista.

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