A contratação de um seguro de saúde municipal para todos os residentes no concelho de Figueira de Castelo Rodrigo já está a concurso pelo preço-base de 300 mil euros. Com esta medida inédita em Portugal, a Câmara local pretende suprir as faltas do Serviço Nacional de Saúde (SNS) num município onde há 6.500 utentes e apenas dois médicos de família.
«Trata-se de uma medida complementar ao SNS, de prevenção e de acompanhamento, para que os nossos munícipes tenham acesso a mais e melhores cuidados de saúde», afirma Paulo Langrouva. Na conferência de imprensa realizada na passada quinta-feira, o presidente do município disse acreditar que este concurso público internacional, «apesar do seu caráter inovador, não ficará deserto» e que em maio será conhecido o vencedor. O procedimento foi publicado em “Diário da República” na última sexta-feira e consiste na aquisição de consultas médicas, de clínica geral, especialidades e Urgência, e acesso a meios complementares de diagnóstico. De acordo com o caderno de encargos do cartão de saúde municipal “Figueira Saudável”, o universo das pessoas seguras são os residentes naquele concelho à data dos Censos de 2011, sendo que os serviços devem ser prestados em rede médica que deverá localizar-se a uma distância inferior a 160 quilómetros em linha reta a partir do centro da vila – o que significa que poderão ser prestados na cidade espanhola de Salamanca.
Além disso, o acesso a estes cuidados deverá ser assegurado «em tempo não superior a sete dias», devendo a seguradora vencedora efetuar um mínimo de 3.000 consultas, outras tantas análises de radiologia convencional e 300 exames de imagiologia, explicita o documento. De fora do concurso ficam o internamento e as cirurgias. O adjudicatário terá ainda de facultar o transporte gratuito destes utentes para a rede médica, não cobrar quaisquer taxas moderadoras e garantir um médico residente em Figueira de Castelo Rodrigo «para acompanhamento e análise das situações clínicas». Segundo Paulo Langrouva, a seguradora que apresentar a proposta «economicamente mais vantajosa» ganhará um concurso que vigorará durante um ano, renovável. Por sua vez, Feliciano Martins, presidente da Assembleia Municipal, sustentou que «em Figueira de Castelo Rodrigo, como no resto do interior, tudo é mais difícil de conseguir, sobretudo o direito à saúde, que não está a ser assegurado pelo Estado».
De resto, os responsáveis autárquicos não acreditam que esta medida venha a resultar num esvaziamento do Centro de Saúde local, onde é necessário «ir de véspera» para ter consulta: «Seria absurdo. Atualmente, temos apenas dois médicos e vamos continuar a lutar para que haja mais clínicos para fazer o básico, que são as consultas», especificou Feliciano Martins, que defende mesmo a existência de «um subsistema de saúde ou até de finanças próprios» para os territórios de baixa densidade. Para avançar com este procedimento, a autarquia muniu-se de um parecer do professor catedrático Eduardo Paz Ferreira que conclui que este seguro «não tem qualquer conflitualidade em termos de competências e atribuições com o Ministério da Saúde» e que a autarquia tem «o dever de zelar pelas melhores condições para os seus munícipes. «Uma medida como o seguro de saúde municipal “Figueira Saudável” contribui para reduzir a desigualdade factual no acesso a cuidados de saúde pelos munícipes de Figueira de Castelo Rodrigo, estando em plena conformidade com o princípio da igualdade», conclui o professor da Faculdade de Direito de Lisboa.
Luis Martins