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As éguas lusitanas fecundadas pelo vento

“Entre o rio Anas (Guadiana) e o Promontório Sagrado vivem os lusitanos. As povoações mais famosas na costa, a partir do Tejo, são Olissipo, famosa porque as suas éguas concebem com o vento Favonio…”. Assim se referia Plínio-o-Velho, nos meados do século I d.C. a um dos mitos mais populares em toda a bacia do Mediterrâneo. O mito, propagado desde a época de Homero (séculos IX-VIII a.C.) até Santo Agostinho (séculos IV-V d.C.), era sobre as éguas das proximidades de Olissipo (Lisboa), do cabo da Roca e do Rio Tejo que quando se voltavam para o Oceano eram fecundadas pelo vento de Oeste “reconhecidamente quente e vivificador” (o Favonius romano ou o Zephyrus grego). Os potros nascidos desta “concepção milagrosa” eram velozes como o vento mas, em contrapartida, tinham uma vida muito curta.

Para alguns investigadores este mito vinha, apenas, explicar a reconhecida agilidade e velocidade dos cavalos lusitanos. Mas eis que, segundo uma investigadora espanhola de História Antiga, Alicia Canto, pode haver uma explicação científica para este mito das éguas lusitanas.

Alicia Canto explica que a fecundação das éguas lusitanas podia ter origem numa bactéria conhecida por “Wolbachia”, descoberta em 1927 pelo investigador que lhe emprestou o nome. Esta bactéria tem uma função de “clonagem natural” devido à sua espantosa capacidade de transformar o sistema reprodutor do seu hospedeiro como, por exemplo, a reprodução assexual de fêmeas ou mesmo a degeneração e a morte prematura do hospedeiro.

Assim, as éguas que pastavam na actual zona de Lisboa (talvez das actuais raças “Garrana” ou “Sorraia”, as mais antigas da Península Ibérica) podiam ser fecundadas “sem a intervenção do macho”. A falta de uma explicação racional para a procriação das éguas lusitanas levou os antigos a procurar uma explicação “divina”.

Mas a hipótese adiantada pela investigadora espanhola ainda está numa fase incipiente de estudo. Ela só poderá ser confirmada (ou desmentida) com uma aprofundada investigação genética que passa pelo estudo dos abundantes restos mortais destas raças de equídeos encontrados em inúmeras escavações arqueológicas realizadas na Península Ibérica.

Os cavalos lusitanos, bastante apreciados na época romana, foram representados em belos mosaicos coloridos que decoraram as habitações luxuosas dos grandes proprietários hispano-romanos.

Por: Manuel Sabino Perestrelo

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