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As armas e a autoridade

O que se passou em Tancos é grave e não pode ser encarado com normalidade. Nada foi normal: nem o furto sucedido nem a incapacidade de encetar uma investigação eficaz que rapidamente descobrisse o rasto do material bélico furtado e desse perspetivas sobre a sua recuperação. É, pois, evidente que há várias responsabilidades a apurar – tanto pelo furto inusitado como pelo insucesso da investigação ainda em curso – e com vários níveis de responsabilidade, desde as chefias intermédias, responsáveis operacionais pela guarda dos paióis, ao chefe de Estado Maior do Exército. Sobretudo, custa crer que o sucedido não tenha contado com um mãozinha, se calhar várias, de dentro, o que é particularmente preocupante.

Não é preciso lembrar que material bélico deixado assim sem rasto em mãos estranhas constitui uma ameaça potencial muito séria, que pode acabar a contribuir para mortes inocentes num futuro próximo. Os clientes do mercado negro de armas como as que foram furtadas ao Estado português ou serão terroristas ou máfias de crime organizado. Há uma responsabilidade do próprio país quando deixa de ser capaz de se garantir contra ataques à sua soberania.

Por isso, não se percebe a reação de uns tantos oficiais que se dispõem a depor armas diante do Presidente da República. Como não se percebe que uns tantos analistas falem da falta de recursos do Exército para cumprir a tarefa de guardar bem o seu próprio arsenal. Ouvindo os argumentos, até parece que estamos a lidar apenas com um assalto à messe dos oficiais! Algo correu de facto demasiado mal para ser aceitável.

Decerto, há oportunismo político quando lideranças partidárias da oposição logo pedem a demissão de meio governo como se o caso funcionasse politicamente como uma bomba incendiária de grande raio de ação. Apesar disso, cumpre ao governo e, muito particularmente, ao Presidente da República, comandante supremo das forças armadas, não permitir a menor sombra de leviandade às hierarquias militares e aos âmbitos políticos intervenientes. Depois de se ter permitido que armas saíssem das mãos da autoridade, o pior que se poderia fazer era desarmarmo-nos de autoridade.

Por: André Barata

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