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A preguiça, o Verão, a falta de assunto e o calor

Observatório de Ornitorrincos

O Verão de 2004 promete ser o estio mais memorável desde que Pinheiro de Azevedo gritou “Bardamerda para o fascista”. Tivemos o Europeu por cá e a selecção ficou em segundo lugar, o país arde descontroladamente, João Pinto voltou ao Boavista, a direcção d’O Interior continua a deixar-me escrever neste espaço, José Castelo-Branco continua casado, Cláudio Ramos foi (e presume-se que continue a ser) pai de Maria Leonor, Santana Lopes tornou-se primeiro-ministro, morreram Sophia e Paredes, Mantorras jogou à bola, fiz um pagamento por conta às Finanças mais de uma semana antes do fim do prazo, Jorge Sampaio fez um discurso que toda a gente entendeu, Fernando Rocha fez o público rir com uma piada e não com os palavrões, Manuel Alegre não escreveu nenhum poema sobre a sua própria candidatura a Secretário-Geral do PS e a GNR não foi ainda notícia por nenhuma má razão.

Todos estes acontecimentos extraordinários em apenas pouco mais de um mês de Verão poderão estar relacionados com a tempestade de areia no deserto do Sahara? O mundo não vive de acasos. Deus não joga aos dados, dizia Einstein. Talvez não, mas sabe-se que não desdenha uma partidinha de burro-em-pé ou mesmo uma sessão de dominó. Isto pode ser um sinal dos tempos, mas também pode ser uma pequena borbulha infectada. O mundo, dizem-me, nunca mais será como dantes. Eu duvido. Há coisas que podem mudar, mas não acredito que os fatos-de-treino garridos se deixem de usar já este ano nem que todos os portugueses passem a usar desodorizante diariamente.

E os chinelos de dedo usados em todo o lado? É nas discotecas, nas salas de aula, nos escritórios, nas repartições públicas. Se o novo governo nada fizer quanto a essa praga que alastra a todas as classes sociais e mesmo a todos os sexos, não nos admiraria muito que o país venha a cair ainda mais uns lugares na hierarquia da União Europeia. Com certeza haverá medidas que podem ser tomadas para resolver este problema. O discurso demagógico e populista sobre os chinelos de dedo já chateia.

O Verão vai ainda prolongar-se por mais dois longos meses e quem sabe durar até Outubro ou Novembro. Temo que Portugal não esteja preparado para tempos estivais extraordinários com duração tão prolongada. Em 1975 o Verão aqueceu e durou quase até ao fim de Novembro e deixou o país no estado miserável que se conhece. Esperemos que este ano a silly season acabe mais cedo (ou pelo menos que acabe) e o país reabra a tempo e horas. E já agora, se me é permitido fazer um pedido individual nestas páginas, como eu dormiria mais feliz e sossegado se Luís Delgado e António José Teixeira deixassem de ser o yin e yang do comentário político nacional.

EU NÃO VI NENHUM ORNITORRINCO

Quer dizer, a bem da verdade, vi. Um ornitorrinco monumental. Mas não posso falar dela. A mãe podia não gostar de ver a filha descrita assim num jornal com tão pouca roupa.

Por: Nuno Amaral Jerónimo

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