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A Irmã Lúcia

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Aqui está um caso de grande oportunidade para testar a tolerância dos católicos e do Estado português. A 19/2 fomos bombardeados com a Irmã Lúcia em todos os canais numa ausência de alternativas que faz meditar. E deve-nos fazer pensar esta devoção aos Santos e aos que queremos como tal. Faz meditar ver as placas ao Sousa Martins tanto na Guarda como no Campo Santana. Graças a ti por me salvares o filho, graças pelas bênçãos alcançadas, e tanto outro modo de expressar a crença em alguém e não em Deus.

Entre os muçulmanos há o profeta e há Deus. O profeta veio quinhentos anos depois de Cristo, e Jesus tem o estatuto que se dá a Moisés e Abraão, à parte do legado dos escolhidos, mas não é ele a encarnação de Deus. Esse papel coube a Maomé.

Nós temos uma série de adoração e de representação de adoração que entre os muçulmanos não existem. Nas mesquitas não há figuras e apenas abstracções, pois Deus é irrepresentável para além da prática de fazer o bem e de estar com Ele e as suas escrituras na Terra.

Os católicos têm vindo a embrenhar-se num conjunto de gavetas da adoração a que chamam Santos e com eles se vão identificando atá ao disparate máximo de encontrarem naquela devoção representada algo deles próprios. Adoram-se deste modo a si próprios e não a Deus. Recordo as identificações com os ídolos e as tribos modernas, simulacro e simulação, de Jean Baudrillard.

O enfoque deve dar-se ao extremo desfocado da crença que são os pais de Santo no Brasil e as venerações de Deuses periféricos. Tudo isto é diabolicamente aceite e preservado por uma Igreja vazia de praticantes, mas cheia de Santos representados em estatuetas.

O limite é identificarmos a nossa bondade com as acções da beatificada e vestir-lhe as indumentárias. Vivemos um processo de mutilação da fé de que a Irmã Lúcia e esta trasladação bizarra carrega o ícone. Vejamos como eram milhares a venerar a Amália e agora são dezenas de milhar mais o teatro mediático a venerar um caixão sobre um altar.

É nesta discussão que encontramos uma enorme similitude com a forma muçulmana de estar com a crença. Deus não se discute porque é matéria de Fé. Acreditas ou não e a discussão é supérflua e absolutamente sem sentido. Eu, que acredito numa entidade superior acima de nós e das nossas vontades, identificável por um caminho que se pode escolher de bem ou não, eu que não entendo mais de dez mil beatificados pelo mundo fora, prossigo atrás da cortina que me desfoca esta Igreja que serviu de padrão ao meu processo educacional.

Por: Diogo Cabrita

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