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A inevitável desilusão

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Li pesaroso o “Danúbio”, de Claudio Magris, não porque lhe falte o talento, mas por excesso de cultura e de referências. Tinha visitado “L’Infinito Viaggiare” (crónicas dos 80 e 90) e já me tinha custado percorrer a infindável lista de citações que enchem o livro e afogam o leitor normal, onde sempre me coloquei. “Danúbio” é um livro de viagem de um homem monumentalmente culto, com necessidade de nos provar que o é. Claro que pode ser fascinante, mas vai ao encontro da tese de doutoramento, da dureza e impenetrabilidade de um discurso fechado sobre um mundo que percorremos solitários. Na semana passada resolvi percorrer “Alfabetos”, um livro de crónicas de Claudio Magris que nasceu em Trieste em 1939 e caminha para o Nobel da Literatura. É muito mais fácil para mim agora seguir as crónicas dos anos 2000 traduzidas para português. Continuamos na força esgotante das referências, nas impressões referidas ou ajustadas por pensamentos aprendidos de outros. Magris quase podia acabar os livros com uma bibliografia de dezenas de páginas, como se de um ensaio universitário se compusesse. Eu fascino mais da imaginação, da busca de ideias próprias, da ilusão e da fantasia que percorreu a literatura dos hiper-realistas e hoje enche os textos de Mia Couto. São matérias de gosto. De facto ler teses cansa e por vez de prazer chegamos a trabalho. Sei que Claudio Magris é impressionante e afogo-me de saberes e de histórias bem contadas e magistralmente escritas. Mas no fim tenho uma certa desilusão porque gostava de me fascinar e entreter com a escrita e isso num livro “de fio a pavio”, ele não me dá.

Por: Diogo Cabrita

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