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A guerra perdida

Menos que zero

Os estudantes do Ensino Superior decidiram fazer uma pausa na luta contra o aumento de propinas. A contestação regressará a 24 de Março, Dia do Estudante, com mais uma manifestação nacional. Segundo os dirigentes estudantis, este adiamento está relacionado com a aproximação da época de exames e, consequentemente, com a pouca disponibilidade dos estudantes para este tipo de acções.

Não é, obviamente, uma decisão inocente. A última manifestação foi um fiasco e é notório que a opinião pública está cada vez mais longe das posições defendidas pelos estudantes. Ainda esta semana o barómetro Marktest para a TSF/Diário de Notícias demonstrava isso mesmo: cerca de 66 por cento dos portugueses concorda com o pagamento de propinas e 31 por cento dizem que estão de acordo com o valor máximo.

A opinião pública, que num dado momento esteve com os estudantes, tem vindo a mudar de posição devido à radicalização do discurso e das acções de luta dos estudantes. Como consequência de algumas atitudes menos pensadas, deixou de ser claro qual é, afinal, o verdadeiro objectivo da contestação.

Em primeiro lugar porque os estudantes não souberam centrar o discurso. Do “abaixo o aumento” passou-se para o “abaixo as propinas”. Ora, como revelam os números da sondagem antes referida, não há espaço para a defesa de um sistema de Ensino Superior gratuito. O país atravessa uma crise profunda, as comparações com o sistema Pré-Primário não gratuito são imediatas e as pessoas têm bem presente que uma licenciatura valoriza mais o próprio indivíduo do que a sociedade.

Em segundo lugar porque as invasões de senados e os encerramentos de universidades a cadeado colocaram os estudantes na mira dos opinion-makers. A cada invasão ou encerramento sucederam-se críticas dos vários comentadores e a dada altura deu-se uma coincidência entre a opinião pública e a opinião publicada.

Nos dias que se seguiram a estas acções de protesto, e como resultado das opiniões veiculadas pelos comentadores, as pessoas entrevistadas pelos media apresentaram um estereotipo do estudante do Ensino Superior que se resume em poucas palavras: meninos que não querem estudar, que passam as noites na borga, que têm bons carros e vestem roupas caras. A partir deste momento os estudantes perderam a guerra.

Cientes de que as coisas não estão a correr bem, os dirigentes associativos optaram por fazer uma pausa para que os estudantes possam preparar os exames. Infelizmente, para muitos já é tarde demais: entre recepções ao caloiro, manifestações, greves e encerramentos a cadeado, perdeu-se meio semestre. A luta segue dentro de momentos, mas os resultados das acções de protesto deverão surgir logo que as notas sejam afixadas.

Por: João Canavilhas

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