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A floresta e os incêndios

Crónica Política

Ainda estamos em plena época estival e de prevenção dos fogos florestais e já se escutam as habituais reflexões acerca do que é necessário fazer na nossa floresta para prevenir e minimizar o risco de incêndio.

É certo que coexistem com causas naturais, facilitadas pela falta de ordenamento e limpeza da floresta, outras causas que relevam do foro criminal e que urge também prevenir. Tenho lido e escutado o repetido lamento de muitos, o aplauso justificado ao esforço heroico dos bombeiros, a contínua perda de mancha florestal e o anúncio fácil de novas iniciativas públicas.

Quando o outono chegar e com ele as primeiras chuvas esqueceremos rapidamente o flagelo vivido dos incêndios e as promessas anunciadas andarão já longe das preocupações de quem tem de decidir. Para memória futura deixo aqui, todavia, algumas reflexões, que me parece assertivo enunciar.

A primeira reflexão prende-se com a necessidade de ordenar a floresta.

Para este desiderato não bastam as intenções anunciadas, nem apenas iniciativas legislativas, é necessário voltar a ter estruturas operacionais no território. A decisão do então governo socialista, de que, aliás, também não discordaram os governos de direita que se lhe seguiram, de acabar com a Direção-Geral de Florestas, extinguindo alguns serviços e integrando outros na Direcção-Geral de Agricultura, matou a política florestal em Portugal.

Não se ordenará a floresta, naquilo que é um desígnio nacional, sem voltar a autonomizar a Direção-Geral de Florestas, redimensionando depois a sua rede territorial até a unidade de base.

É urgente voltar a ter uma política florestal que pense o território, ordene a floresta, invista na mais correta arborização e promova medidas de prevenção adequadas.

A segunda reflexão prende-se com o abandono dos pinhais por parte dos proprietários, muitas vezes condicionada pela necessidade económica de mobilidade social da população para zonas mais urbanas. Ora, o facto da propriedade rural e florestal estar em grande parte isenta de imposto, não pesando no orçamento familiar, contribui para o afastamento e abandono da floresta, facilitando a propagação do fogo.

Porventura, será necessário pensar num imposto florestal que penalize os proprietários que abandonam as terras e isente aqueles que as tratam e as limpam.

A terceira reflexão prende-se com a relativa ineficácia do modelo de prevenção municipal. É certo que existem planos que definem a articulação dos agentes locais, enunciam meios e medidas operacionais, mas quase sempre é mais um ritual, um compromisso administrativo, que um verdadeiro modelo operacional.

Neste nível municipal restam apenas os bombeiros com capacidade operativa efetiva, sendo que, embora com reduzida estrutura, tenham surgido também associações e movimentos associativos que mereciam melhor apoio e enquadramento.

A quarta e última reflexão tem a ver com a criminalidade associada aos fogos florestais. Aí, sim, justificavam-se novas iniciativas legislativas tendentes a agravar a moldura penal. Resisti, quanto pude, à tentação de falar acerca do negócio do combate aos incêndios.

Não vale a pena perder de vista o objetivo principal que deveria presidir a emergente preocupação nacional: Ordenar é Prevenir!

Por: Júlio Sarmento

* Antigo presidente da Distrital da Guarda do PSD e ex-autarca de Trancoso

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