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«A data da Feira tem de ir de encontro à presença entre nós dos portugueses na diáspora»

António Oliveira, presidente da direção da AENEBEIRA

P – Quais as expectativas para mais uma edição da Feira de São Bartolomeu?

R – As expetativas são as melhores dentro do que é o contexto nacional que o país vive há uns anos a esta parte. Este sucesso da Feira de São Bartolomeu é uma parceria organizativa estabelecida entre a Câmara Municipal e a AENEBEIRA desde 1992. Esta parceria tem 22 anos de existência e esperamos que prossiga nos próximos eventos. Este ano, até por dificuldades financeiras, temos uma parceria onde estão definidas as funções de cada uma das entidades. A AENEBEIRA não tem absolutamente nada a ver com o processo de animação, espetáculos e infraestruturas para os mesmos, que ficam a cargo apenas da Câmara e da empresa municipal Trancoso Eventos. O mesmo acontece com a vedação do recinto da Feira que este ano também é da responsabilidade do município, sendo que até agora, e desde finais dos anos 90, vinha sendo responsabilidade da associação empresarial. A AENEBEIRA fez tudo o resto, a organização dos diferentes espaços, a feira do artesanato, a feira de atividades económicas, as tasquinhas, as farturas e as diversões. Do ponto de vista da AENEBEIRA estamos claramente satisfeitos e reconhecidos por esta parceria que dura há 22 anos se ter mantido com a nova liderança do município de Trancoso.

P – Este ano uma das alterações tem a ver com o modelo de organização que estava concentrado na parceria entre Câmara e AENEBEIRA. A Câmara preferiu ficar responsável pela animação? Tem a ver com questões de financiamento ou com questões político-partidárias?

R – Tem a ver com questões de financiamento. Não tem absolutamente nada a ver com questões político-partidárias. Na primeira reunião que tivemos sobre a edição de 2014 da Feira pusemos claramente a questão à Câmara Municipal: nós não tínhamos condições financeiras para nos envolvermos no processo de espetáculos e de animação, bem como na vedação da Feira. É muito simples. A Feira obteve apoios durante vários anos e há dois anos que não tem qualquer tipo de comparticipação comunitária mas antes teve através do Sistema de Apoio a Ações Coletivas, o SIAC da CCDRC, e teve antes disso também alguns apoios noutros anos da Raia Histórica através da abordagem Líder do Proder. Nos últimos dois anos não houve e havia aqui alguma almofada financeira da AENEBEIRA que desapareceu porque, como tínhamos os equipamentos comparticipados, os stands, a feira de artesanato e a vedação, isso libertava-nos meios que podíamos aplicar no processo de espetáculos e de animação. A parceria da AENEBEIRA com a Câmara está a decorrer perfeitamente.

P – Quais as principais novidades da edição deste ano?

R – A principal novidades para esta edição é uma tenda eletrónica com Dj’s, alguns conhecidos a nível nacional, que é também da responsabilidade da Câmara Municipal e que ficará situada no campo da Feira, mesmo em frente ao palco, numa zona que estava ocupada por restaurantes, já que este ano estarão apenas nas partes laterais. É uma aposta para atrair juventude e para responder a alguns anseios da camada mais jovem da população que gostaria de ter em Trancoso alguma animação com Dj’s conhecidos e que se prolongasse durante a noite. Essa tenda vai funcionar a partir da meia-noite e meia, a hora em que normalmente terminam os espetáculos no palco principal, e até às três e meia. Outra novidade é tentar dar uma nova dinâmica à feira de gado que decorria tradicionalmente durante a Feira de São Bartolomeu. Deste modo, no dia 22, no mercado de leilão de gado haverá uma feira em que o município de Trancoso tem como parceiro fundamental a Cooperativa Agrícola Bandarra e estão empenhados em retomar a tradição das grandes transações de gado bovino e equino que se faziam em Trancoso.

P – Quantos expositores vão estar presentes?

R – No total da Feira, entre os diferentes agentes económicos, estarão cerca de 135 expositores distribuídos por 200 stands ou locais de exposição, sendo que no pavilhão multiusos estarão 83 stands.

P – Houve grande capacidade de atração ou a crise também se faz sentir?

R – Não nos podemos queixar da capacidade de atração. Houve agentes económicos interessados, como nos anos anteriores, e temos a lotação da Feira preenchida. O único sítio onde se nota alguma diminuição e onde tem havido menos procura é na parte das tasquinhas, mas isso tem a ver com outras questões organizativas. As tasquinhas queixam-se muito da concorrência desleal que lhes fazem os pontos de venda só de cerveja colocados habitualmente pelo patrocinador. Este ano já reduzimos um ponto de venda de cerveja. As tasquinhas típicas são caras, colocamo-las à disposição dos interessados exatamente ao preço que pagamos a quem monta para cumprir as exigências legais de acordo com as normas em vigor quer por parte da delegação de saúde, quer por parte da ASAE. Como são espaços caros, e se eles entendem que têm a concorrência desleal de pontos de venda de cerveja, é complicado. Este ano a condição que pusemos ao patrocinador da feira foi diminuir um ponto de venda de cerveja e vamos ver para o futuro se não teremos que tomar atitudes ainda mais duras nesse aspeto porque as pessoas que vêm à Feira gostam também de estar nas tasquinhas, de provar a gastronomia da região e isso é fundamental e importante.

P – Os preços dos stands mantiveram-se?

R – Todos os locais, – seja para o setor automóvel, maquinaria agrícola, diversões, atividades económicas ou tasquinhas -, continuam com o mesmo preço.

P – Quais os preços das entradas para os diferentes dias?

R – As bilheteiras este ano também serão da responsabilidade da Câmara. Só haverá bilhetes em cinco dias. Amanhã, dia da abertura, entre as 14 e as 20 horas, e que tem a ver com a transmissão do programa da TVI “Somos Portugal” em direto do recinto da feira. No sábado (Ruth Marlene), dia 19 (Augusto Canário), 22 (Blind Zero) e 23 (José Malhoa), os espetáculos também vão ser pagos. O preço é de 2,5 euros nos dias 16, 19, 22 e 23 e de dois euros no dia 15. Estes preços são penalizantes para quem conta arrecadar receita porque são os mesmos que vigoraram nos últimos anos e em 2012 a taxa de IVA incluída nestes preços era de seis por cento e agora é de 23. Portanto, há uma receita efetiva de bilheteira que vai diminuir. Já diminuiu em 2013 e este ano vai manter-se.

P – Qual é o investimento da parte das atividades económicas?

R – Na parte das atividades económicas temos um orçamento de 52 mil euros mais IVA. Consiste nos alugueres dos stands, de lotes de terreno para exposição de maquinaria agrícola, automóveis, diversões, tasquinhas e as despesas que têm a ver com publicidade que foi assumida por nós, bem como parte da vigilância diária e da montagem e desmontagem da feira. Naturalmente que a vigilância e segurança dos espetáculos será da responsabilidade do município e depois todas as outras despesas têm a ver com processos de limpeza do pavilhão e de aluguer de todos os stands. Contrata-se também algum pessoal para a Feira e há seguros e publicidade. As nossas receitas provêm do aluguer dos espaços. Temos um orçamento sem IVA de 52.086 euros de gastos e de 52.016 euros de rendimentos. Está tudo equilibrado.

P – A Feira de São Bartolomeu é um ponto de encontro dos portugueses da diáspora, nomeadamente dos emigrantes. Como é que Trancoso conseguiu essa capitalidade e continua a ser assim?

R – Continua a ser assim, se bem que temos um problema complicado relacionado com as datas da feira. Os emigrantes querem a antecipação do certame. Na cidade, as pessoas de mais idade, por uma questão de tradição, batem-se pelas datas históricas, ou seja, levar a Feira até dias 23, 24 ou 25 porque o dia de São Bartolomeu é a 24 de agosto. Isto vai ao arrepio dos interesses dos portugueses da diáspora porque muitos dos nossos emigrantes partem a partir do dia 20. A comunidade suíça parte a partir dos dias 18, 19 e a de França entre os dias 20 e 22. No próprio dia em que fizemos a apresentação da Feira em Trancoso houve emigrantes a queixarem-se. Eu dava até como sugestão Trancoso pensar no que acontece com a Feira de São Mateus. Em Viseu ultrapassaram essas questões da tradição. Lembro-me da Feira de São Mateus começar a 6 de setembro e terminar a 22 de setembro, depois veio para 1 de setembro, mais tarde para 20 de agosto, depois para 15 de agosto… Este ano abriram a 8 de agosto e encerram a 24 de setembro. E o dia de São Mateus é 22 de setembro, isto para tentar atrair e aproveitar ao máximo os emigrantes. Em Trancoso, uma forma de dinamizar a Feira de São Bartolomeu é de assumir, de forma clara, que o certame, sabendo-se que tem que começar sempre a uma sexta-feira e prolongar-se até um domingo, tem que se realizar entre os dias 8, 9, 10 e 20 de agosto.

P – Porque é que isso não foi feito este ano, já que o ano passado já foi este o modelo? É a Câmara que tem que decidir?

R – Nós próprios também concordámos com esta data. A minha opinião sempre foi a antecipação mas estou farto de ser maltratado pelos trancosenses residentes ou alguns que não vivem em Trancoso, mas que vêm cá e ficam muito ofendidos por a Feira não se realizar nas suas datas históricas. Não percebem é que atualmente a dinâmica deste tipo de eventos depende muito dos portugueses que estão na diáspora e cansei-me de ser o “mártir” a defender uma causa que ainda me levava de vez em quando a ter aborrecimentos e situações menos agradáveis. Portanto, dei por bom, como já dei no ano passado quando foi até dia 25, que se mantivesse a data. Mas para a manutenção da Feira no futuro, os órgãos competentes, como a Câmara e a própria Assembleia Municipal, devem refletir seriamente sobre as datas que têm de ir de encontro à presença entre nós dos portugueses na diáspora e isso, à semelhança do que está a fazer Viseu com a Feira de São Mateus, obriga a antecipar a Feira a partir de 9, 10 e até 20,21. Não se chega ao dia de São Bartolomeu, ficamos a dois ou três dias. São Mateus fica a 10 por vezes…

P – Ano após ano, esta Feira continua a atrair pessoas de toda a região. Como é que explica esta situação?

R – Continua a atrair pessoas fundamentalmente a norte e isso tem muito a ver com a tradição centenária. A Feira de São Bartolomeu é uma das mais antigas feiras francas do país, senão mesmo a mais antiga. Foi criada há 741 anos, em 1273, por D. Afonso III. É uma feira com grande tradição e onde as pessoas normalmente comercializavam os seus produtos desde o próprio nordeste transmontano. As pessoas deslocavam-se de Mogadouro e Alfândega da Fé para Trancoso com os gados e compravam também os produtos de que necessitavam para o inverno, nomeadamente em termos de abrigo e de conforto. Portanto, tem uma tradição histórica e secular. Em 1992, a Feira estava completamente em extinção. Quando eu era garoto, a Feira anual começava a 18 e acabava a 24. Os dias fortes eram 21,22 ou 23. A Feira estava em extinção nos anos 90 quando se iniciou esta parceria entre a AENEBEIRA e a Câmara de Trancoso. A Feira era basicamente a sexta-feira que ficasse mais próxima do dia 21 ou 22. A quinta-feira mexia qualquer coisa mas no sábado já estava tudo a desmontar. E ao dar-se-lhe este aspeto lúdico de exposição, de diversões, de espetáculos, recuperou-se muita dessa tradição. Aliás, foi o que tinha feito 20 anos antes Viseu e a Feira de São Mateus.

P – Considera então que o peso da história é uma componente essencial para a sua dimensão?

R – Sim porque a tradição da Feira não se nota para lá do Mondego. A tradição da Feira é tudo para norte. As pessoas que habitualmente vêm à Feira são de Armamar, São João da Pesqueira, Tabuaço, Torre de Moncorvo, Vila Nova de Foz Côa, Penedono, Aguiar da Beira ou Mêda. É sempre para norte e para o vale do Douro. De resto, para sul “morre” no vale do Mondego. De Celorico da Beira para lá não atrai quase ninguém. De Fornos de Algodres sim porque há localidades desse concelho que ficam a oito quilómetros de Trancoso. Há, pelo menos, uma freguesia de Fornos que, historicamente, fazia mais vida com Trancoso do que com a sede de concelho e só o não faz hoje porque durante muitos anos a estrada pela Serra do Pisco não estava alcatroada e quando o foi já tinham perdido esse hábito.

P – Apesar da crise, está então confiante no sucesso desta edição?

R – Face à procura que tivemos, temos todos os espaços ocupados, e naturalmente que estou confiante.

P – Em termos de visitantes, tem algum número estimado que gostasse de atingir?

R – Nós calculamos que ao longo destes 10 dias possam visitar a feira cerca de 100 mil pessoas.

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