Na espuma da discussão política interessa a alguns apresentar argumentação para esconder as suas responsabilidades no definhamento do nosso país e, em particular, das regiões mais despovoadas e com elevado envelhecimento populacional.
É confrangedor assistir ciclicamente à discussão sobre a coesão territorial, o despovoamento, o envelhecimento e a depressão económica de muitos territórios no interior do país. Mas importa lembrar que estes problemas têm uma relação direta com opções políticas, não apenas do PSD e do CDS, mas também do PS, que dá a mão ao PSD em opções de desfiguração do poder local, seja pela via do financiamento, seja pela via da reconfiguração territorial, ao não implementar o primado constitucional, a regionalização.
O Governo minoritário do PS não pode sistematicamente escudar-se no anterior Governo quando não se aproxima do PCP e de outros para debelar os problemas do mundo rural e inclusive arquitetar premissas inexequíveis perante a reposição de freguesias, mas sim, apostar no caminho de agravar a acessibilidade dos utentes em virtude da concentração de serviços públicos, mesmo na pandemia.
Atacar os serviços públicos afeta com maior intensidade territórios de baixa densidade e com povoamento mais disperso. Com o encerramento das escolas definharam as aldeias; encerraram estações de correio, encerraram tribunais, tudo isso faz aumentar os custos para quem vive no interior.
Concentrar serviços de saúde é dificultar a vida no interior, reduzir o funcionamento dos postos da GNR é reduzir a segurança e o sentimento de segurança, nomeadamente dos mais velhos, a maioria dos residentes em territórios despovoados. Acabar com as Juntas de Freguesia é não só atacar a democracia, acabando com o órgão do Estado de proximidade, mas também eliminar um órgão que reivindica condições para a existência de vida em parte considerável do território nacional.
Os ditos defensores do interior são fomentadores do definhamento do mundo rural. Antes da pandemia já sofríamos de outra maneira a segregação territorial com a inexistência de rede pública de transportes, de rede de comunicações que permitam a acessibilidade à Internet em condições, como nos grandes centros urbanos.
Os municípios são cada vez mais reféns de uma dívida colossal à Águas de Portugal e a privatização da empresa de resíduos teve repercussão no elevado aumento do custo indireto na fatura da água. Também a desresponsabilização do poder central em áreas fundamentais do Estado acarreta maiores dificuldades para os municípios com maior dispersão populacional e, por conseguinte, menor força reivindicativa.
É hora de congregar e fomentar a solidariedade entre territórios, estes com pessoas e não meros enquadramentos geométricos de análise oculta às verdadeiras necessidades. Alguns responsáveis do PSD, ao focarem-se na data das próximas autárquicas, estão a tentar branquear a sua responsabilidade na supressão de autonomia do poder local. É fundamental ter políticas públicas ao serviço do Povo e não manter incólumes os interesses dos grandes grupos económicos, bem patente nas PPP’s rodoviárias e na saúde.
A exigência dos autarcas de todo o interior deveria ser no sentido de articulação nas reivindicações com vista à “migração” de investimentos públicos e por conseguinte aglutinando os privados, pois há equipamentos públicos ao abandono ou subaproveitados no interior enquanto no litoral há défice desses mesmos equipamentos públicos pela excessiva concentração populacional.
As assimetrias territoriais reproduzem as sociais e, por conseguinte, o abandono da coesão territorial e social. São tempos de refundar a democracia participativa para legitimar os valores da democracia de Abril e travar o retrocesso social que muitos advogam, com ímpetos populistas ou não, mas que não querem o Estado como alavanca da solidariedade e justiça social.
Honorato Robalo
Militante do PCP