Enquanto a Europa tarda em aprovar um plano de recuperação económica e Portugal é excluído dos “corredores” de turistas, o mundo sofre de forma violenta com a pandemia. Milhares de mortos por todo o planeta numa afirmação impressionante da fragilidade humana, das organizações e dos países (ver os Estados Unidos responder às dificuldades, à morte dos seus cidadãos, da forma que temos visto é inacreditável).
Mas é também um tempo de enorme mudança e adaptação à nova realidade, ao “novo normal” – muitos dizem mesmo que as transformações, nomeadamente digitais, foram de uma rapidez tão extraordinária que a humanidade desenvolveu em meses o que seria expetável em anos. Mas muitos ficaram para trás. Muitas das pessoas, pela sua condição, pela idade, pelo contexto social ou económico, não vivenciaram essas transformações, não conseguiram acompanhar essa impressionante metamorfose. E essa pode ser uma outra consequência grave dos tempos que vivemos: a exclusão de quem não consegue adaptar-se.
Agora sem confinamento, o país volta a estar assustado com o aumento de infetados, em especial na região de Lisboa, mas com o relaxamento, por todo o lado, aparecem novos casos de Covid-19.
Uma festa de anos na Guarda colocou em sobressalto a população do interior, que até agora tem estado um pouco distante dos principais surtos pandémicos. Por isso, exigem-se mais cuidados e o cumprimento das regras de higiene e distanciamento físico. Os convívios e pequenas festas que se vão realizando, pelo desejo de recuperação da normalidade e depois de meses de isolamento, são compreensíveis e até desejáveis, mas podem ser perigosos nestes tempos de pandemia.
Enquanto o país chora a falta de turistas ingleses, e de tanto outros países, com mais infetados e mais mortos pelo Covid-19 do que Portugal, talvez faça sentido olharmos para além da economia: imaginem-se as consequências sanitárias se abríssemos as portas a milhares de ingleses infetados… Se nos focarmos só nas desastrosas consequências económicas, efetivamente a subida do número de infetados é uma tragédia a todos os níveis. Mas se pensarmos nas consequências de recebermos turistas originários de países com milhares de mortes por Covid-19, e com uma taxa de letalidade muito superior à nossa, teremos de nos perguntar se queríamos mesmo mais turistas ingleses.
É esta situação que vive neste momento Espanha. Depois de dois meses fechados, com 29 mil mortes pelo novo coronavírus, mais 14 mil não identificadas como tal, e mais de 253 mil infetados, durante 12 dias em junho sem reportar dados oficialmente, Espanha conseguiu mostrar ao mundo que tinha a situação controlada e graças a isso passou a ser um destino “seguro”. Uma patranha à espanhola. Os “reproches” estão por todo o lado. Na Catalunha terá de haver o regresso ao estado de alarme e ao confinamento obrigatório e no resto do Estado há aumento de casos diariamente em todas as regiões. Mas ficaram bem na fotografia dos corredores seguros para turismo. Mentindo. Porque em Espanha as mortes que ocorrem em lares de idosos não são contabilizados como consequência da pandemia. Só os mortos em centros sanitários (hospitais e centros sanitários) e antecipadamente confirmados por PCR (testes positivos) entram nos resultados. Em Badajoz tem havido centenas de infetados nos últimos dias, mas foram os espanhóis a pedir o encerramento da fronteira no Alentejo por causa do foco em Reguengos de Monsaraz… Espanha é o sétimo país com mais mortes por Covid-19 do mundo, mas o mundo só fala dos mortos nos Estados Unidos e no Brasil. E é o país que mais e melhor esconde os números verdadeiros, responsabilizando as comunidades autónomas e fazendo um resumo nacional de acordo com os seus interesses.
Talvez ninguém o queira ouvir, e não duvidando da relevância para a sobrevivência económica do país, mas ter as fronteiras abertas aos espanhóis ou aos ingleses poderá salvar-nos o emprego, mas pode levar-nos à morte.