A escalada de intensidade, amplificação de motivações e disseminação territorial das reações à morte de George Floyd desenterraram os fantasmas de assuntos mal resolvidos do período da colonização e precipitaram uma tremenda “confusão das coisas”, gerando-se um clima de crispação e confrontação social extremamente perigoso.
Há muito que os países colonizadores, onde Portugal se inclui, deveriam ter iniciado a última fase do processo de descolonização: a fase de pacificação entre os representantes dos agentes envolvidos, através de um esforço de conciliação dos respetivos legados históricos herdados, mesmo que, no imediato, se alcance apenas a “paz possível”.
Há muito que a promoção da cultura científica e da educação para a cidadania deveriam ocupar um lugar cimeiro nas agendas políticas dos governos centrais, locais e entidades supranacionais.
A biologia mostra que todos os seres vivos partilham uma origem evolutiva comum e que a percentagem de variabilidade genética interna dos grupos que designamos por “raças” é muito superior à percentagem de variabilidade genética entre esses mesmos grupos.
A antropologia ensina que não há “raças superiores” e “raças inferiores”, apenas comunidades humanas que ostentam maior ou menor diversidade biológica e cultural entre si.
A história revela os perigos inerentes às diferenciações valorativas entre o “nós” e os “outros”, sobretudo se essas diferenciações ostentarem o rótulo de uma suposta credibilidade científica e servirem para justificar discursos político-ideológicos de teor segregacionista. Explica também as diferentes motivações que podem presidir à edificação, à preservação ou à demolição de estátuas e monumentos.
O civismo, por seu turno, assenta em pilares como a tolerância, o respeito e a compreensão pela diferença, mas também contempla a capacidade de se distinguir entre uma manifestação pacífica contra o racismo e a participação num ato de vandalismo e de ofensa às autoridades policiais.
Enquanto permanecermos reféns de uma classe política dominante formatada para não arriscar pisar a linha do “politicamente correto” e incapaz de enfrentar olhos nos olhos questões fraturantes da sociedade portuguesa e enquanto vivermos num país onde a promoção da cultura científica e a educação para a cidadania permanecem miragens, as “Joacines” e os “Venturas” terão um oásis inteiro à sua disposição!
Em política, sempre que o “centro” falha, os “extremos” aproveitam!