Os doentes chegam-nos temerosos, pela dor de cabeça incapacitante e pela causa da mesma, que sempre associam aos piores motivos.
Embora saibamos que a maioria das dores de cabeça raramente se associa a outra condição médica, esta deve sempre ser excluída e uma vez afastada a dor pelos “piores motivos” vários são os doentes que de imediato se rotulam como tendo enxaquecas.
Mas afinal o que é a enxaqueca?
É uma doença benigna, caracterizada por uma dor unilateral, latejante ou pulsante. Pode acompanhar-se de náusea, vómito e sensibilidade à luz e som. Cada episódio pode durar de 4 a 72 horas. O número de crises varia de pessoa para pessoa.
Para algumas pessoas, um sintoma de aviso conhecido como aura ocorre antes ou durante a dor. Uma aura pode incluir alterações visuais (flashes de luz ou pontos cegos), formigueiros e dificuldade em falar. Como causa da doença descrevem-se fatores ambientais e genéticos, sendo conhecida a hereditariedade familiar da patologia. As mulheres são mais afetadas e é na adolescência que se relatam os primeiros episódios.
Conhecem-se vários “gatilhos” que podem despoletar a dor: períodos de alterações hormonais (período menstrual, gravidez e menopausa); toma de contracetivos orais; alimentos como queijo e chocolate; bebidas alcoólicas ou com muita cafeína; stress; luzes, sons e cheiros fortes e irregularidades no padrão de sono.
Como nem toda a dor de cabeça é enxaqueca, nota para a cefaleia de tensão, dor de cabeça mais frequente em adultos. Distingue-a da enxaqueca a dor bilateral tipo pressão, sem sintomatologia acompanhante, relacionada com uma contração dos músculos da cabeça e pescoço, ligada a alterações emocionais e físicas, como falta de repouso e problemas posturais.
De volta às enxaquecas, ainda que a teoria satisfaça os mais curiosos, quem “as tem” sabe de cor o texto e procura soluções práticas que reduzam o seu caráter incapacitante. A boa notícia é que aliada a terapêutica não médica, técnicas de relaxamento e evicção dos “gatilhos” descritos, dispomos de terapêutica médica para crises e prevenção das mesmas, com benefícios claros na redução da frequência e gravidade da dor.
Num período de incertezas múltiplas, desocupemos as nossas cabeças com as enxaquecas que nos impedem de contemplar a beleza da vida, pois aqui também pode ficar tudo bem.
* Interna de Medicina Geral e Familiar na USF “A Ribeirinha”, na Guarda
N.R.: A rubrica “ABC Médico” é da responsabilidade do grupo de Internato Médico da USF “A Ribeirinha”, da Unidade Local de Saúde da Guarda, e pretende aumentar a literacia em saúde na área do distrito da Guarda. O objetivo desta coluna mensal é capacitar a comunidade a fazer parte integrante do seu processo de saúde/doença, motivando-a para comportamentos de vida saudáveis e decisões adequadas. Para tal, serão escolhidos temas pertinentes que serão apresentados por ordem alfabética, daí a designação “ABC Médico”.