Região

«As pessoas estão preocupadas, até assustadas, mas tranquilas»

Escrito por Luís Martins

O INTERIOR acompanhou uma patrulha da GNR por algumas aldeias do concelho do Sabugal no âmbito da prorrogação do estado de emergência e cruzou-se com pouco mais de meia dúzia de pessoas na rua.

«Pela sua segurança fique em casa». A mensagem sonora do carro patrulha da GNR ressoa nas ruas e praças vazias das aldeias do Sabugal, um dos concelhos mais envelhecidos do país. Na sexta-feira, O INTERIOR acompanhou uma patrulha do posto local e cruzou-se com pouco mais de meia dúzia de pessoas entre Águas Belas, Quinta do Clérigo, Caldeirinhas, Sortelha, Urgueira e Sabugal.
«É muito raro ver pessoas nas ruas e nas praças. A população está tranquila e a acatar as ordens das autoridades ficando em casa. Notamos também que os cidadãos estão bem informados e conhecem os procedimentos em vigor», adianta o alferes Miguel Soares, do núcleo de Relações Públicas do Comando Territorial da GNR da Guarda. O oficial foi destacado para acompanhar O INTERIOR neste périplo guiado pelos cabos Lourenço e Magalhães, da secção de policiamento comunitário e prevenção criminal do Destacamento da Guarda. O objetivo é ver como as medidas determinadas pelo estado de emergência estão a ser cumpridas, ou não, e sensibilizar a população mais vulnerável para a necessidade de recolhimento geral e o dever especial de proteção.
«Numa primeira fase, a GNR assume uma vertente pedagógica, de sensibilizar para o cumprimento das normas em vigor, mas pode ser mais repressiva em caso de incumprimento reiterado ou desobediência», refere Miguel Soares, referindo que tem havido «alguns incumprimentos», sobretudo por parte de estabelecimentos comerciais. O oficial sublinha que, «de uma maneira geral, nota-se alguma preocupação e há até pessoas assustadas, mas os mais velhos, porque são de outra geração e já passaram por muito, acham que nada lhes vai acontecer e mostram alguma resistência». A primeira paragem acontece em Águas Belas, onde a patrulha encontra uma septuagenária à porta de casa, de regresso de um terreno agrícola onde foi buscar um borrego. A mulher diz saber que não deve andar na rua, mas justifica esta saída com o facto de ter ido buscar o animal. «É ali perto, não falei nem me cruzei com ninguém», justifica. O argumento não evita que a GNR reforce a mensagem da importância do dever de recolhimento.
Uns quilómetros mais à frente entramos na Quinta do Clérigo, um aglomerado de uma dezena de casas, maioritariamente vazias. Ali vivem atualmente cerca de 15 pessoas. Duas delas estão à conversa na soleira da porta e a patrulha para para saber o porquê. O homem tinha estado a lavrar um terreno da vizinha, ambos sabem que se deve evitar «ao máximo» os contactos. «Eu aqui não tenho medo, nem estou assustada, porque somos poucos. Só tenho pena é de quem vive nas grandes cidades, pois aí é que é mais complicado e há mais perigo», admite a O INTERIOR a mulher. A GNR alerta os dois residentes para os burlões, «que se aproveitam desta situação para enganar as pessoas mais vulneráveis», e pergunta se tem havido emigrantes a regressar. Na Quinta do Clérigo não, apenas uma senhora que veio de Lisboa há quinze dias.

«A desobediência é crime»

«O fluxo de pessoas que residem noutros pontos do país e no estrangeiro foi mais intenso nos dias que antecederam a declaração do estado de emergência, agora praticamente não há e quando sabemos da chegada de alguém de fora abordamos essas pessoas para ficarem em confinamento durante 14 dias. E é o que fazem porque também estão assustadas», declara o alferes Miguel Soares. De regresso à estrada, passamos pela pequena localidade de Caldeirinhas, de ruas vazias onde ecoa a mensagem sonora da GNR: «A desobediência é crime», sobressai. À saída, um homem está à beira da estrada e diz à patrulha que veio ao seu terreno para «espairecer a cabeça». Além do mais, aproveitou para cortar «uma pernada que já estava caída» e leva lenha para casa num carrinho de mão.
Em Sortelha, a dona do supermercado da aldeia admite que vai fazendo «algum negócio» e garante que as pessoas são «cuidadosas, não saem de casa. Só para o essencial». Nesta Aldeia Histórica, uma das mais procuradas da rede, também o turista desertou. A patrulha segue caminho em direção à sede do concelho, mas antes atravessa a Urgueira, onde se cruza com um trabalhador agrícola e aborda uma família de etnia cigana cujas crianças andam na rua. O patriarca ouve os conselhos dos militares e justifica que as menores «não saem da soleira da porta». O aviso está dado. No Sabugal, o carro liga momentaneamente a sirene e volta a difundir a mensagem gravada. Os poucos transeuntes ouvem com indiferença os apelos para que fiquem em casa «pela sua segurança. Pela segurança de todos».

GNR em contacto telefónico com idosos

A GNR está no terreno para garantir que se cumpram as medidas do estado de emergência.
Além das patrulhas diárias, no âmbito do programa “Idosos em Segurança”, a GNR colocou militares e civis a contactarem telefonicamente idosos isolados – estão sinalizadas mais de 800 pessoas nessas condições só no concelho do Sabugal –, aos quais prestam informações sobre os cuidados a ter para evitar a infeção pelo vírus Covid-19 e questionam se precisam de medicamentos ou bens alimentares. Em caso afirmativo, são informados os serviços das respetivas Câmaras Municipais ou Juntas de Freguesia, que depois diligenciam a entrega ao domicílio.
A GNR continua igualmente a visitar os idosos que vivem sozinhos e/ ou isolados, alertando-os também para as tentativas de burlas e de furtos com o pretexto do vírus. Nestas abordagens, os militares são ainda chamados a averiguar para o eventual surgimento de situações de fome ou de outra carência não sinalizada anteriormente. «Estamos na fase de mitigação, em que o contágio acontece na comunidade, pelo que é essencial que as pessoas, mais do que nunca, fiquem em casa e se isolem», recomenda a GNR.

 

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