1. Numa altura em que muitos já regressam de férias, os partidos preparam o “arranque” da campanha para as próximas eleições legislativas. Os estudos de opinião dizem-nos que o PS parte muito à frente e que até pode abdicar do BE e do PCP para formar maioria (ou pelo menos de um deles).
Como se percebeu na semana passada, António Costa tem a extrema-esquerda bem amarrada, ao ponto de só ao quinto dia da greve dos motoristas termos ouvido Jerónimo de Sousa defender os trabalhadores e o direito à greve. Mas os bloquistas e comunistas, silenciados durante quatro anos de “geringonça”, terão de rugir na campanha, sobre o risco de perderem eleitores e influência. Os comunistas recuperaram para as suas hostes um conjunto de direitos e regalias que podem manter o eleitorado mais fiel, mas dificilmente atrairá o voto jovem. E o Bloco, sem contestação ao poder, pode atrair os jovens seduzidos pelos clichés habituais dos desalinhados, mas não tem nada para dar. O PS pode ficar tranquilo com o silenciamento da esquerda. E mais tranquilo ainda pelo silêncio e inépcia da direita. Rui Rio fez parte da maioria dos portugueses que, estando a banhos, estava muito mais preocupado em ter combustível para regressar de férias do que com as muitas horas de trabalho dos motoristas. Para ele, como para a maioria dos portugueses, a ordem é o mais importante. A greve não incomodou ninguém e, não fossem os diretos televisivos, não teria qualquer relevância. Mas vai voltar, em setembro, para perturbar a tranquilidade governamental e melhorar em 50 euros os ganhos dos motoristas que trabalham 15 horas por dia – o que, sendo extraordinário, não merece solidariedade de ninguém!
2. Esta é a fase dos partidos saírem à rua, visitarem as feiras, as empresas e as instituições. É o tempo dos contactos diretos e de ouvir as pessoas – ainda que nenhum político ouça de facto os cidadãos: eles sabem tudo, conhecem tudo, têm posição sobre tudo e o partido sabe o que é melhor para todos. Na região, que já teve alguma relevância eleitoral, com o despovoamento e um método eleitoral que valoriza a demografia em detrimento dos territórios, a “nacionalização” dos deputados é um facto. Os candidatos a deputados defendem as posições definidas pela estratégia nacional do partido e o que poderia ser do interesse das pessoas que por cá vivem não tem defesa possível. Ou antes, tem se for enquadrável na estratégia nacional e vá de encontro àquilo que os “ideólogos” do partido definem como importante para as pessoas que vivem nos territórios de baixa densidade – não ouvem as reivindicações mais genuínas, mas sabem melhor do que quem cá vive o que é determinante para o seu futuro. A resiliência dos que ficam nas nossas aldeias, vilas e cidades merece uma palmadinha nas costas e uma lição de política, mas pouco mais do que isso.
Na semana passada destacámos neste jornal que o movimento que reúne empresários, sindicatos e utentes da Beira Interior reivindica a abolição das portagens nas antigas SCUT e quer o apoio dos candidatos a deputados pela região. Carlos Peixoto veio explicar a posição do PSD de forma inequívoca: o PSD defende o princípio do utilizador-pagador e a manutenção das portagens, ainda que possa considerar a defesa da redução da taxa e a valorização de medidas que possam reduzir a tributação fiscal às empresas e pessoas que vivem no interior – uma lengalenga com mais de 20 anos. A narrativa de Rui Rio é esta: os recursos do país são finitos e todos temos de pagar. E foi isso que o cabeça-de-lista do PSD nos veio recordar. A nacionalização dos deputados é isto: assumirem a narrativa nacional sem sequer pestanejar, sem corarem de vergonha quando nos dizem o que é melhor para todos pagarmos as autoestradas mais caras do país, com distâncias longas para podermos chegar a algum lado, estarmos mais longe e não fazer sentido lutar por uma autoestrada gratuita – porque as PPP têm de ser pagas pelos utilizadores, mesmo que a construção das autoestradas tenha sido financiada pelo orçamento europeu, mesmo que haja milhões para a banca, para os transportes públicos de Lisboa e Porto, para recomprar a TAP e todas as demais opções de Lisboa (como o agora anunciado tratamento gratuito dos dentes até aos 18 anos, mas só para quem vive em Lisboa, pago pela Misericórdia de Lisboa que recebe dinheiro do país todo, nomeadamente dos Jogos, mas também do Orçamento de Estado), mas no interior nem podemos defender a gratuitidade das autoestradas que foram construídas e financiadas pela Europa para desencravarem os territórios de baixa densidade. Em campanha, os políticos deviam ouvir mais e falar menos, até porque para dizerem o mesmo que o chefe já disse o melhor é estarem calados.