A propósito do encerramento de estações de correios, voltamos a ouvir falar de uma putativa nacionalização dos CTT. A empresa privatizada por Passos Coelho, e exemplo habitual do «ir além da Troika», num tempo que dava lucros prestando um serviço público por todo o país, rendeu 900 milhões ao Estado há cinco anos. Desde então, duplicou o preço dos serviços de correspondência, passou a ser deficitária, tornou-se numa empresa financeira, encerrou estações de correio por todo o lado, substituiu os serviços de correios por agências, anuncia encerramento em mais localidades, especialmente no interior, e vale metade do que os atuais proprietários pagaram na privatização. Em síntese, o Estado fez um bom negócio ao ver-se livre de uma empresa cujo serviço, por muito relevante que ainda seja, tem a sua morte anunciada.
Podemos olhar para trás e, nostálgicos, recordar o tempo em que todos enviávamos cartas – cartas de amor, aos amigos e familiares, aos políticos ou até aos diretores de jornais… Mas hoje, hoje, recebemos cartas com as faturas dos serviços onde ainda não disponibilizámos o correio eletrónico, folhetos, alguma propaganda e pouco mais.
Recordo que no final do secundário escrevia cartas quase diariamente, em especial no período de férias, numa troca de correspondência com um grupo de colegas, como se fosse uma sociedade “dos poetas mortos”, antes mesmo do filme de Peter Weir e de Robin Williams nos ensinar a viver a poesia com outra intensidade – carpe diem porque a vida é curta e é necessário aproveitá-la ao máximo. Escrevíamos poemas, os meus completamente pueris e sem interesse, mas assim partilhávamos versos e palavras que nos enchiam a alma enquanto descobríamos Alexandre O’Neill, Al Berto, Florbela, Herberto, Drummond de Andrade ou Eugénio de Andrade, entre tantos outros. Nessa troca de correspondência, seguindo Aleixo, dava até para fazer introspeção e olharmo-nos ao espelho de outra forma. Mas isso foi “no tempo” em que escrevíamos cartas. E líamos poesia. Hoje… os poemas são lidos no smartphone, as cartas são mensagens rápidas no messenger e as formais seguem por e-mail.
O negócio dos CTT será financeiro e de entrega das encomendas que vamos fazer online. Em nome do interior abandonado e despovoado, podemos continuar a reivindicar a reabertura de estações de correio e podemos defender a (re)nacionalização dos Correios, fazendo um favor aos donos do CTT, que hoje dá prejuízo. Para o interior devemos defender investimentos, nomeadamente públicos, pensar estrategicamente o território, exigir serviços desconcentrados, discutir a organização do Estado e reclamar descentralização. Mas, no país que não conseguiu transferir o Infarmed de Lisboa para o Porto (!) é improvável que alguma coisa se possa mudar em prol da coesão territorial e do desenvolvimento regional. O que o interior precisa é de serviços com futuro e investimentos sustentáveis. Até lá, o melhor é voltarmos a Pessoa, porque «Uns, com os olhos postos no passado/Vêem o que não vêem: outros, fitos/Os mesmos olhos no futuro, vêem/O que não pode ver-se» (in “Odes” de Ricardo Reis).