Anda por aí, literalmente, uma mania que não compreendo. À noite, acumulam-se centenas de pessoas nas ruas a andar a pé sem nenhum destino concreto. Saem de casa apenas para caminhar. E é isso que não entendo. Andar não é um fim, é um meio. Se não é para ir a nenhum lado, fica-se em casa. Sentado, de preferência.
Reconheço que com a crise do preço dos combustíveis, caminhar pode conferir uma satisfação extra. Andar cinco quilómetros a pé, mesmo sem nenhum objectivo, garante a sensação de se poupar mais ou menos um euro. Dá pelo menos para pagar os dois pães que se têm de comer quando se regressa ao lar. Se é para não ir a lado nenhum ao menos que não se arrombe o orçamento familiar.
Outra possibilidade será a de os portugueses caminharem na esperança secreta de adquirirem resistência suficiente para fazer corridas matinais e poderem chegar a primeiro-ministro. Manuela Ferreira Leite é séria? Pelo menos parece. Pode ela ser primeira-ministra? Não. Precisamente por ser séria, nunca a veremos de calções a correr pelas praças deste mundo. E sem destreza nas corridas não se chega à chefia do governo. Os meus compatriotas que se passeiam ambicionam secretamente o Palácio de S. Bento.
Repare-se que José Sócrates não correu no Kremlin para não ser apanhado por Putin e ser nomeado o seu sucessor. Lembremos que o primeiro-ministro não correu em Luanda para fugir de Eduardo dos Santos e não ter de fazer negócios com o governo angolano. Não, Sócrates correu porque quis. Tal e qual esta gente que se pavoneia pelas avenidas iluminadas andando de cá para lá. Aliás, considero de algum mau gosto esse exibicionismo provinciano. Sempre que os vejo de fato de treino a calcorrear a calçada pareço entender nos seus olhares enviesados para o meu carro (que já tem 18 anos e pode portanto votar em políticos que não corram) um olhar triunfante. “Eu vou a pé porque posso”, parecem dizer eles. Para ser verdadeiro, eu também poderia caminhar, as minhas pernas funcionam razoavelmente bem – pelo menos comparadas com as do Mantorras. Mas a verdade é que não me apetece andar sem ter razão para tal. A não ser que tivesse o carro estacionado por ali perto.
Os “caminhadores” são a mais nova espécie de moralistas. Porque se acredita agora que caminhar faz bem, como antes se julgava que a masturbação causava cegueira (o que é totalmente mentira, o único risco real são as tendinites). Mas eu desconfio sempre das novas descobertas da medicina. O único dado concreto de que disponho é que na Europa medieval os camponeses andavam a pé e a esperança média de vida era de 35 anos. E na altura os atropelamentos eram mais raros.
Por: Nuno Amaral Jerónimo