1. Há dias, passou um documentário no Discovery Channel sobre os Descobrimentos portugueses, intitulado “Naus e Caravelas”. A produção era norte-americana, como é norma naquela estação. O programa apresentou-se bastante equilibrado, quer do ponto de vista narrativo, quer do rigor histórico. Incluía depoimentos de historiadores e investigadores nacionais, bem como figuras ligadas à oceanografia. A que se juntaram declarações de investigadores indianos, japoneses e um luso-descendente de Malaca. A informação centrou-se na tecnologia marítima e militar desenvolvida pelos portugueses nos séculos XV e XVI, e sobretudo na construção naval. Até aqui, nada a apontar. Todavia, há um aspecto que, infelizmente nada tem de insólito, mas já começa a ser anacrónico. Trata-se da reconstituição dos ambientes da época, com figuração própria. Os marinheiros portugueses eram apresentados como um grupo de façanhudos, supersticiosos, briguentos, pouco mais do que homens de Neandertal manejando astrolábios, quadrantes e levantando padrões por onde passavam. O próprio infante D. Henrique mais parecia um ayatollah do séc. XV. Imagino que se mostrassem as portuguesas de então, decerto não faltariam bigodes farfalhudos e peitos de fazer inveja à Ursula Andress.
2. Entretanto, na Antena 1, emissão regional de Coimbra, foi entrevistado um Professor daquela Universidade, creio que geógrafo. A tese trazida pelo académico era, basicamente, a refutação da existência de qualquer fenómeno de aquecimento global, devido a causas não naturais. Segundo ele, as estatísticas demonstram que as condições climáticas sofrem alterações cíclicas e relativamente duradouras; que o eixo da Terra não é fixo; que os vikings povoaram a Gronelândia numa altura em que havia ali um clima temperado, após o que tiveram de abandonar o território, devido à chegada de um período de glaciação; que o nível do mar subiu somente 25 cm no último século; que há notícia de as calotes terem derretido em épocas geológicas distantes; que o aquecimento se centra nas cidades, etc. Segundo o eminente professor, podemos estar pois tranquilos. E as imagens dos ursos polares a afogarem-se por falta de gelo, ou o avanço dramático do mar em certos pontos da costa, ou os níveis alarmantes de CO 2 na atmosfera? Bah! Tudo não passa, segundo ele, de um fait divers de ignorantes para entreter outros ignorantes. Porque o arauto da verdade, de toda a verdade, é ele, com aqueles típicos tiques escolásticos que ditam a genuflexão e ordenam a reverência da populaça. Confesso que esta postura, se fica bem no imaginário e na tradição, é irreconciliável com a ciência. Adiante. Sobre esta polémica, gostaria de dizer o seguinte. Não sou cientista nem possuo informações que permitam uma posição consistente. Mas sou por natureza um “duvidador” metódico. Sei que a existência do aquecimento global não é consensual na comunidade científica. Trata-se de uma hipótese séria e perfilhada, com várias nuances, pela generalidade dos cientistas. Não é ainda uma certeza, mas anda lá perto. Curiosamente, segundo li no Courrier Internacional, praticamente todos os investigadores paladinos do negacionismo são financiados pelas multinacionais a quem o negócio já começou a “correr mal”. Precisamente por causa destas “insignificâncias” lançadas pelos ecologistas.
3. Provavelmente, nunca mais voltarei a bater nesta tecla. Mas a rejeição estética que o PCP me provoca vai muito além da mera opinião ou do posicionamento político. Há dias, estava tranquilamente a ver um bloco noticioso na SIC N e deparo com uma manif informal do PCP. Ou seja, uma decoração preparada para o seu secretário-geral brilhar no prime time. Fixei-me sobretudo no cenário e na pose. Jerónimo parecia um boneco articulado, destilando ressentimento por todos os poros. A pose e a linguagem gestual convulsiva eram exactamente as mesmas de um inflamado pastor evangélico, diante da sua assembleia. Que a espaços se aproximava mesmo de um arteriosclerótico e, no limite, do estertor de um zombie. Exactamente como nos filmes. A coisa metia medo. A alucinação devia-se ao embalo proporcionado pela recente contestação de rua, que aquela força política já começou a contabilizar a seu favor, inflacionando-a até à demência. Pergunto: o que pode levar estas pessoas a culpar tudo à sua volta, sem sequer lhes passar pela cabeça que elas também são responsáveis? Padecem de uma disfunção social básica que nunca irão admitir. Dizem subestimar a individualidade, mas é no pathos manifestado por cada um que se encontra a resposta para tanto ódio. Os comunistas são incapazes de integrar com normalidade uma sociedade plural, onde o bem comum é uma tarefa partilhada e sujeita a correcções permanentes. As bizarras manifestações de paroxismo que exibem são a imagem perfeita, não só da sua falência ideológica, mas sobretudo humana.
Por: António Godinho