P – O Ecoprojecto é o mais jovem movimento de defesa da Serra da Estrela. O que pretendem em concreto?
R – O nosso principal objectivo é sensibilizar para a necessidade de apostar no desenvolvimento sustentável da Serra da Estrela. A ideia surgiu de conversas de há muitos anos sobre o estado de coisas na Serra e, inevitavelmente, chegou o dia em que percebemos que poderíamos fazer algo para inverter algumas das situações mais preocupantes. Ainda não estamos constituídos enquanto associação, somos apenas um movimento, embora estejamos associados à Plataforma de Desenvolvimento para a Serra da Estrela. A maioria dos elementos tem as suas raízes na Covilhã e cresceu em simbiose com o elemento “Serra”, assistindo às alterações que sofreu nos últimos anos. E acreditamos que se tem perdido muita qualidade, pese embora existir cada vez mais quantidade e oferta. Mas a quantidade não implica qualidade. Actualmente, a Serra está bastante descaracterizada e não tem havido uma preocupação em realçar e promover o que tem de melhor. O turismo está completamente virado para a neve e todas as actividades são pensadas em função da época de Inverno, o que, para nós, é negativo.
P – Já existem vários movimentos relacionados com a Serra da Estrela. O que vos distingue dos outros?
R – Nunca sentimos o movimento como “mais um”. Muito pelo contrário, acreditamos que é necessária uma reflexão para encontrar uma resposta sobre o porquê de existirem tantos projectos desta ordem. Obviamente, será porque algo não está bem. Contudo, na Covilhã, somos o único movimento ecológico e sustentável assumidamente ligado à Estrela.
P- Quais são, então, os problemas que mais os preocupam?
R – Antes de tudo, é importante que haja uma mudança de mentalidades sobre o turismo sustentável. Poderá parecer um tanto ou quanto linear, mas a verdade é que a falta de civismo das pessoas é, talvez, o factor que mais contribui, actualmente, para a degradação da Serra da Estrela. A montanha constitui um chamariz extraordinário para o turista, que desfruta das suas potencialidades. Contudo, em troca, quem vem não respeita o meio ambiente. Para a maioria dos visitantes, a Estrela representa neve e pouco mais. A sua passagem pela região limita-se a dois ou três pontos comerciais, como a Torre ou o centro comercial. Compra-se queijo, presunto e faz-se o tradicional “sku” – e abandona-se o saco de plástico ou o trenó partido em qualquer lugar. Não é difícil encontrar viaturas abandonadas ou até electrodomésticos.
P – Nesse sentido, por onde poderá e deverá passar o futuro da Serra da Estrela?
R – Não é das bermas das estradas ou espreitando do café da Torre que é possível observar os verdadeiros tesouros da Serra. Por isso consideramos que a montanha está subaproveitada. A sua beleza reside no contacto com as populações locais, no conhecimento e na valorização das tradições ancestrais, na busca de lugares recônditos – que são de uma beleza extraordinária. Há tanta coisa bela e que mesmo quem cá vive desconhece! O documentário de Jorge Pelicano, “Ainda há pastores?”, surpreendeu Portugal ao mostrar a realidade vivida nos Casais de Folgosinho. Contudo, e como gira tudo em torno da Torre, é natural que estes cenários naturais passem ao lado do turista comum. Por outro lado, quase já não há pessoas a fazer o nosso queijo de forma tradicional, a pastorícia corre o risco de desaparecer em breve… No entanto, se o turismo fosse canalizado para ir ao encontro destes factores, poder-se-ia revitalizar estes e outros saberes e tradições. De resto, sabemos que quem vem de fora gosta de contactar com estas realidades. E este é o verdadeiro conceito de turismo sustentável. No Verão, a Serra está verdadeiramente subaproveitada, quando há muito para ser explorado, dos desportos radicais aos roteiros pelas aldeias, que são de uma riqueza impressionante. Na Serra nem tudo pode ser neve, até porque há o risco desta poder ser cada vez mais rara.
P- Por onde passará o trabalho do Ecoprojecto?
R- Há algum tempo que temos vindo a realizar uma série de actividades centradas, por exemplo, na recolha de lixo. Contudo, a iniciativa que marcou o arranque formal do nosso movimento foi o fórum realizado a 15 de Dezembro e onde procurámos debater, com uma série de personalidades ligadas à Serra, o futuro da montanha. Nos próximos tempos está agendada uma acção de sensibilização na estância de esqui da Torre, para alertar os visitantes para a questão do ambiente. Acreditamos que a sensibilização é importante, porque têm acontecido inúmeras recolhas de lixo, mas todos os anos ele volta a aparecer. Por isso, é preciso mudar as mentalidades e apelar ao civismo de quem visita a Serra. Temos também agendadas várias maratonas fotográficas de forma a divulgar, junto da comunidade, a beleza natural da Serra da Estrela. Denunciar o que não está bem é importante, mas o fundamental é divulgar, em simultâneo, as potencialidades da nossa montanha. No final da época da neve vamos promover mais uma caminhada de recolha de lixo, mas em colaboração com outras entidades para haver maior impacto. Para além disso, iremos centrar a nossa acção junto das escolas da região.