Os últimos números foram contabilizados no passado dia 20 de Outubro. Até essa data, 41 mulheres já tinham recorrido à interrupção voluntária da gravidez no Hospital Pêro da Covilhã e mais de cinco dezenas passaram pela consulta prévia obrigatória por lei.
Nos últimos quatro meses têm chegado àquela unidade situações «verdadeiramente dramáticas». É Francisco Elias, obstetra responsável pelas consultas, quem o garante. A maioria das mulheres que recorreram ao serviço estão desempregadas e não são menos frequentes «situações familiares muito complicadas», adianta o clínico. Mesmo assim, o grupo destas mulheres é muito heterogéneo. «Chegam-nos pacientes de todas as idades e estratos sociais», refere, sublinhando que, ao contrário do que se poderia pensar, «têm sido poucas as adolescentes a procurar ajuda». Apesar de tudo, há um ponto comum a todas estas mulheres: a maioria nunca frequentou o Planeamento Familiar, «apesar das consultas serem gratuitas», realça o médico. Outra similitude referida por Francisco Elias é que nenhuma «abortou de ânimo leve, apenas por abortar». Interromper uma gravidez não desejada é um «momento difícil e muito violento, mesmo para os profissionais que trabalham no serviço», garante o obstetra.
«Temos sido confrontados com histórias de vida impressionantes», confidencia. A pensar precisamente nestas situações, há um psicólogo e uma assistente social disponíveis para ajudar depois da interrupção da gravidez. A lei prevê que antes da realização aborto tenha lugar uma consulta prévia, momento em que as grávidas «são informadas de todos os procedimentos». No caso do Hospital da Covilhã, estas consultas têm lugar às segundas-feiras à tarde e às quintas de manhã. É feita uma ecografia para averiguar o tempo de gravidez. Francisco Elias explica que se este for inferior a sete semanas, «o aborto é realizado através do recurso a medicamentos». Caso este tempo seja ultrapassado, o procedimento já é outro e a interrupção é feita «pelo método de aspiração». Depois da consulta prévia, a lei determina que haja um período de reflexão que não pode ser inferior a três dias – durante o qual a mulher pode usufruir do acompanhamento de um psicólogo. Só depois é marcado o aborto, 15 dias após o qual é obrigatória a marcação de uma consulta de obstetrícia e planeamento familiar.
Francisco Elias explica que nenhum dos procedimentos comporta «qualquer custo para a mulher», embora cada intervenção custe ao hospital uma média de 150 euros. Valores, contudo, «muito inferiores àquilo que o Estado despendia com as muitas mulheres que recorriam às parteiras e eram hospitalizadas depois de intervenções mal sucedidas», refere o obstetra. No Hospital Sousa Martins, na Guarda, as mulheres que pretendam realizar uma interrupção voluntária da gravidez são reencaminhadas para o Hospital de S. Teotónio, em Viseu. Isto em virtude de oito dos 10 especialistas do Serviço de Obstetrícia terem invocado objecção de consciência. No entanto, a unidade hospitalar escusou-se a revelar qualquer detalhe sobre o assunto, para garantir «a imagem dos profissionais do hospital e a privacidade das mulheres que já realizaram o aborto». Recorde-se que a nova lei foi promulgada a 10 de Abril, permitindo o aborto a pedido da mulher até às 10 semanas de gravidez e entrou em vigor em Julho.
Rosa Ramos