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Secretário

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Embora seja uma profissão quase exclusivamente desempenhada por mulheres, o título aparece no masculino por duas razões: porque todas as profissões têm sido tratadas no masculino e para a distinguir do mobiliário de escritório. É a única profissão que pode ser confundida com uma mesa de trabalho. Isto pode provocar afirmações ambíguas como “Dei uma joelhada na minha secretária” ou “Deixei a secretária de pantanas”. É verdade que é em secretárias que os secretários trabalham. Mas podia ter-se feito um esforço um bocadinho maior para conseguir outra designação. Os profissionais que vendem sexo não se chamam “cama” ou “atrás do pinheiro”.

Um secretário competente é alguém que organiza não só toda a agenda das pessoas para quem trabalha como gere a vida interna da organização. Se as donas de casa estivessem na classificação nacional das profissões seriam “secretárias executivas da vida doméstica”. Os homens seriam, obviamente, os estafetas (vulgo moços de recados).

O leque de requisitos para secretariar uma empresa ou um serviço vão desde o conhecimento de línguas estrangeiras (não necessariamente no sentido anatómico, embora ligações com o exterior possam trazer vantagens comparativas) à utilização de ferramentas informáticas (para, por exemplo, criar folhas A4 com frases como “Sorria no trabalho” e espalhar pelo escritório). O uso especializado de lâminas de papel para abrir correspondência permite uma mais fácil reconversão profissional a talhantes e faquires. Um secretário deve também estar completamente inteirado do funcionamento orgânico da empresa para que não haja focos de entropia prejudiciais à produtividade, como trocar títulos académicos dos administradores (segundo a metódica organização portuguesa de distinção entre “senhor arquitecto”, “senhor doutor” e “senhor engenheiro”, por ordem alfabética) ou pôr em linha a mulher do chefe quando este fala com a namorada. São erros como estes que, ao afectar as empresas em pequena escala, acabam por impedir o crescimento económico do país e a sua competitividade internacional.

O sonho do secretariado é democrático, mas sem ser a festa que o primeiro-ministro anuncia. Exige uma capacidade laboriosa de organização de pastas com documentos que um secretário de qualidade sabe serem totalmente inúteis. O facto de ser capaz de organizar um arquivo desses documentos com uma ordem temática demonstra o engenho evolutivo da espécie humana. Embora não seja obrigatória a frequência universitária, a passagem pelos bancos das faculdades permite a aquisição de conhecimentos e competências importantes para a vida profissional de um secretário. Níveis elevados de extracção de fotocópias, reconhecimento de letras manuscritas (para copiar os apontamentos do colega), escrita manual rápida (para apanhar as ideias vagas do professor que nunca se cala), descodificação e interpretação (para entender as duas ideias realmente importantes de uma aula de duas horas) e o fomento da intriga nos corredores são alguns exemplos. Além do óbvio, claro, que é aprender a distinguir um arquitecto de um doutor e de um engenheiro.

Se há quem queira ser secretário, há ainda mais quem gostasse de ter um. Todos os homens sonham em poder contar com alguém que lhes organizasse a vida, atendesse telefonemas, recebesse o correio, marcasse encontros, reuniões e jantares de família e despachasse pessoas incómodas. Mas a grande maioria não pode pagar a um secretário, por isso arranja uma namorada. Tem a vantagem de ficar mais em conta, mas não nos trata por “senhor doutor”.

Por: Nuno Amaral Jerónimo

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