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Nunca Estivemos Melhor

O barril de petróleo atingiu hoje, na Bolsa de Nova Iorque, o preço recorde de 88 dólares o barril. Como Portugal é um dos países energeticamente mais dependentes da União Europeia, estas são péssimas notícias. Mais uma subida e entramos em graves dificuldades.

A nossa taxa de desemprego ultrapassou a espanhola, pela primeira vez em décadas. As empresas vão fechando, umas atrás das outras. Há sectores em crise, uma crise esperada, como os têxteis a confecção e o calçado, mas há outros em que as causas não são tão evidentes (embora baste pensar um pouco no assunto para as compreender), como por exemplo a construção civil. Com tanta gente à procura de emprego e cada vez menos a descontar para a Segurança Social, vemos esta a entrar em colapso a um ritmo cada vez mais acelerado.

O poder de compra dos funcionários públicos degrada-se de ano para ano. Depois de verem os seus salários congelados durante anos sucessivos, viram-nos depois ser aumentados a taxas abaixo da inflação. Entretanto, aparecem as primeiras medidas a atacar a segurança dos seus empregos. Fala-se de listas de disponíveis, de mobilidade especial, de extinção de serviços.

A corrupção grassa, ou pelo menos assume-se agora que é um problema. Os crimes violentos parecem aumentar de dia para dia. Não há já nem bons nem brandos costumes. É como se todos os bandidos do mundo tivessem descoberto a nossa vulnerabilidade e deliberado expô-la à luz do dia. Já nem se fala do roubo por esticão, muito menos de “ratos” de automóveis. Agora, para ser notícia, é preciso haver tiros.

Um dia, Costa Gomes disse na Assembleia Geral das Nações Unidas que Portugal era o país mais livre do mundo. Não era verdade, mas parecia-o por comparação com o passado. Hoje, volta a haver tiques de autoritarismo. É possível e legítimo insultar Bush, ao menos nos EUA, mas já não criticar Sócrates sem o tradicional “respeitinho”. À mínima critica, aparecem a policia e os processos. Dizem que é melhor o passarinho calar o bico.

Os exemplos podiam continuar e todos eles levariam a uma evidente conclusão: “isto” bateu no fundo. Se piora mais um pouco, a “coisa” torna-se insustentável. Pois.

“Isto” nunca esteve tão bem como agora. Há cada vez menos pedintes, menos pessoas com fome, menos pobreza. A Segurança Social abrange cada vez mais utentes e resolve cada vez mais casos. O país encontra-se ligado por uma rede de auto-estradas que era impensável há trinta anos atrás. Hoje é possível ir da cidade da Guarda a qualquer ponto do país em menos de seis horas. É possível ir e voltar no mesmo dia. O saneamento básico, a água canalizada, a electricidade, os acessos em estrada alcatroada, os infantários, os centros de dia para idosos, generalizaram-se. A economia paralela perde terreno. O analfabetismo é cada vez mais residual, o acesso à universidade cada vez mais facilitado. Todos os lares, ou ao menos a esmagadora maioria, têm televisão, frigorífico, comida na mesa. Morre-se já não de fome, mas de obesidade e excesso de comida. A esperança de vida à nascença subiu para uns (antes) impensáveis 78 anos para as mulheres e 75 para os homens. A mortalidade infantil é residual. O acesso aos tribunais e à justiça, se é verdade que tem problemas e insuficiências, nunca foi tão facilitado e generalizado. A opinião pública está cada vez mais atenta, mais critica, mais implacável. A Internet e os blogues depressa ridicularizam os actuais, e patéticos, tiques de autoritarismo.

Acreditem em mim, nunca estivemos tão bem. Nunca houve uma época da nossa história em que tivéssemos tanta qualidade de vida, tantas oportunidades à nossa disposição. Gostamos é de nos queixar.

Por: António Ferreira

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