A campanha referendária foi, provavelmente, a mais inútil de todas as que decorreram até hoje em Portugal. Desde logo, porque o assunto está relacionado com valores éticos muito pessoais que não mudam com esclarecimentos, discussões ou testemunhos de pessoas mais ou menos conhecidas. Depois, porque ao longo destes últimos dias foram utilizados – por uns e outros – argumentos completamente absurdos que só confundiram ainda mais aqueles que poderiam ter dúvidas.
Penso que o referendo nasceu torto, pois a pergunta feita aos portugueses já induz uma das respostas possíveis. Pergunta-se: Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras dez semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?
Mas também se podia perguntar: Concorda com a liberalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras dez semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?
São duas formas de perguntar o mesmo, mas que poderiam originar resultados diferentes. Para mim, a segunda forma até se aproxima mais da verdade, pois o que se pretende saber é se os portugueses concordam que o aborto seja liberalizado até às dez semanas, e se o Estado deve financiar um acto médico que não é diagnóstico nem terapêutico.
Votar SIM é assumir que o aborto é uma forma de contracepção, é pensar que desta forma se dignificam as mulheres, é aceitar que a vida humana é insignificante até à 10ª semana. Para mim nada disto é verdade, por isso vou votar NÃO.
Nota: Um dos absurdos ouvidos nesta campanha foi este. A despenalização leva à redução do número de mulheres que recorrem à interrupção da gravidez.
Estariam a referir-se a mulheres masoquistas?
Por: João Canavilhas