À dona Berta, não havia quem a aturasse. Depois de muitas saídas, umas por ineptas, outras por preferirem patroas melhores. Um dia, lá veio uma criada com que a boa da Bertinha engraçou. O pior foi aquele medo, de que a mulher se fosse embora, com que passou a viver. Calhou contar à amiga esta sua preocupação e, juntas, lá arranjaram um estratagema para que isso não acontecesse. Com filhos em muito boa idade de trabalhar, aquela criada preferiu pô-los no liceu. Por isso, talvez prometendo-lhe arranjar emprego para cada um deles, quando acabassem os estudos, se conseguisse comprometê-la o suficiente para que, à primeira, não fugisse porta fora. Aliás, bom mesmo seria prometer ajudar os jovens a conseguir boas classificações escolares. Sempre ajudariam a melhorar o tipo de emprego e eram bem mais fáceis de arranjar do que o dito. Como ambas tinham um rol de afilhadas de casamento que eram professores no liceu, bem podiam agora cobrar-lhes o facto. A bem ou a mal que dessem as notas necessárias aos filhos da criada. Claro que à dita o estratagema não passou despercebido e desatou, ela própria, também a traficar notas. No início, indiretamente, através da patroa. Por fim, quando as afilhadas-professoras percebiam de onde a “cunha” vinha, nem era preciso mais nada, porque naquele tempo, tal anomia, de resultados académicos, padrinhos e afilhados, queijos, azeite e cabritos, não impressionava ninguém, sendo muito bem aceite a troca de prendas e favores para subir qualquer valor menos simpático.
Hoje, os professores, em vez de se acharem respeitados e recompensados, protestam. A maioria deles fantasia acerca das intenções da tutela, porque nem os media tradicionais consomem. Os sindicatos e as bolhas das redes sociais completam, com bastante encarniçamento e pouca capacidade reflexiva, o circuito informativo da cartilha defendida: “desvalorização da carreira, miséria dos vencimentos, más condições de trabalho, casa às costas”. No fim rematam que é tudo em nome dos alunos e da escola pública. Aliás, os sindicatos deveriam até mudar o nome para “sindicatos dos alunos e da escola pública”, uma vez que deixaram de defender, exclusivamente, a classe dos professores e defendem agora a escola pública, e os alunos, fechando as escolas. O que até é bem feito para os alunos, pois ousaram todos ir lá, deficientes incluídos, e a aí permanecerem até aos 18 anos. Ainda por cima, como se tudo isto não bastasse, todos no mesmo espaço de aulas e atividades, o que dificulta a ação docente. A culpa disto tudo, como bem se sabe, é das manias inclusivas, esse grandessíssimo pecado, do ministro. Manias que nem muitos dos pais compreendem e aceitam, porque “a escola para todos é uma utopia”. Como é que alguém vai ser capaz de afirmar que, com ação do professor, assim pulverizada pela sala de aula em vez de concentrada na média de acesso à universidade dos seus rebentos, não são os “bons alunos” os únicos prejudicados? Obviamente que esses pais, e alguns destes professores, nada têm contra a inclusão. Só não concordam com o ministro.
“Antigamente é que era…”
“Os sindicatos e as bolhas das redes sociais completam, com bastante encarniçamento e pouca capacidade reflexiva, o circuito informativo da cartilha defendida: “desvalorização da carreira, miséria dos vencimentos, más condições de trabalho, casa às costas”.”