1) Vamos por os pontos nos i’s. Os governos do prof. Cavaco Silva fizeram várias autoestradas de norte a sul do país e revolucionaram a mobilidade terrestre em Portugal. O governo do eng. Guterres continuou a dar nova vida aos nossos territórios, lançando a A23, A24 e A25. Os governos do eng. Sócrates completaram essa rede e construíram na nossa região o importante IP2, que liga Celorico da Beira a Bragança. O governo do dr. Passos Coelho encontrou o país de cócoras, na bancarrota e foi a “troika” chamada pelo PS que lhe disse que não podia gastar dinheiro em estradas, ordenando que a prioridade das despesas do Estado se centrasse nos salários dos funcionários públicos e nas reformas dos pensionistas.
Os governos do dr. António Costa, livres de quaisquer amarras e recebedores de contas mais certas, foram, a este nível de infraestruturas rodoviárias, um nado morto. Não investiram um cêntimo e não construíram na região Centro um quilómetro de asfalto que fosse. O IC6 (Coimbra-Covilhã) caiu no esquecimento e até o pequeno troço Candosa-Oliveira do Hospital foi sucessivamente adiado. O IC7 (nó de Folhadosa, em Seia-Celorico da Beira) não passa de uma miragem e a velha EN 17, com um piso do século passado, está para durar. O IC37 (Viseu-Seia) é apenas uma ilusão das populações e forças políticas locais, pois não sairá do papel nos próximos anos. Há sempre redentoras desculpas. Primeiro, a culpa era do Passos Coelho, a seguir da gerigonça, depois da pandemia e agora é dos estilhaços da guerra na Ucrânia.
De alibi em alibi, de balela em balela, o dr. Costa transformou-se num burocrata de reação às circunstâncias, num gestor de conjunturas e de horizontes curtos. Não cria e não tem estratégia, nem rasgo, que nos aponte o caminho das estrelas, nem que fiquemos a meio, como alguém já disse. Cada ano que passa somos ultrapassados no nosso crescimento por vários países que há poucos anos eram pouco mais que “medievais”. Na Estónia, na Eslovénia, em Malta, na República Checa, na Lituânia, já se vive melhor e já se produz mais que em Portugal. A Roménia, que visitei em 1990 e que então estava na “pré-história do desenvolvimento”, está agora a um passo de nos deixar para trás.
Vem tudo isto a propósito do malfadado IP3, aquela estrada que envergonha qualquer português e que retrata bem a incapacidade e o atavismo de quem nos governa. Uma via que liga duas das maiores capitais de distrito do país (Viseu e Coimbra) onde ainda se circula à velocidade de um trator e onde é preciso apontar a mira para não embater no separador central, sujeitando quem a usa a uma espécie de jogo da roleta russa, é própria de um país do terceiro mundo e é um paradigma do nosso atraso relativamente a outros países que fazem acontecer e que tratam os contribuintes todos da mesma maneira, sejam eles da capital ou do interior. As obrinhas e mais obrinhas que por lá proliferam nada resolvem, são um sorvedouro do erário público e só obrigam os utilizadores a terem acrescidos tormentos com desvios ainda mais sub-mundistas.
2) Havia uma enorme crença que o promissor Ministério da Coesão Territorial fizesse o seu trabalho em prol da reconversão do IP3 em autoestrada, de preferência sem portagens. Mas não, perdeu 4 anos em anúncios e acaba de se esvaziar com o desaparecimento da Secretaria de Estado da Valorização do Interior, opção que, não obstante a cosmética orgânica do Governo, indicia que daqui em diante estes territórios serão ainda mais irrelevantes e esquecidos. Enfim, resta-nos gritar “oh da Guarda!”, mesmo que o dr. Costa tenha apagado da sua órbitra a Secretaria de Estado da Ação Social, que aqui estava sediada e cujas competências vão passar a ser exercidas na capital de um reino que a vários níveis está quase tão sinistro como o IP3.
* Advogado