Novak Djokovic não se quis vacinar, mas quis jogar o Open da Austrália e aí defender o seu título. Para poder entrar na Austrália, que exige prova de vacinação para entrada de estrangeiros ou prova de que a vacinação não é possível por razões médicas, a organização do torneio obteve-lhe a necessária isenção médica. Não se sabe em que termos, mas provavelmente não muito convincentes já que o governo australiano decidiu revogar-lhe o visto e recambiá-lo para a Sérvia.
Djokovic recorreu aos tribunais e ganhou. A comunicação social portuguesa limita-se a relatar a decisão final, pouco dizendo sobre a fundamentação. O “New York Times” vai um pouco mais longe e revela que o juiz decidiu com base em falhas processuais: Djokovic viu o visto ser-lhe revogado sem que as autoridades, contrariamente ao inicialmente prometido, o tivessem deixado contactar com a organização do torneio e resolver o problema de alguma forma. Entendeu por isso o juiz que ele tinha sido tratado injustamente e determinou a sua libertação imediata. Nada que não pudesse acontecer por cá, mas há muito mais a dizer.
Novak alegou, como alegaram os seus advogados, que tendo acusado positivo à Covid-19 em 16 de dezembro, e considerando o tempo decorrido, se encontra curado e não constitui perigo para terceiros. Seria por isso essa a sua razão médica para não necessitar de ser vacinado. O problema é que no mesmo dia em que foi diagnosticado com Covid foi visto em público, e outra vez no dia seguinte, numa entrega de prémios onde compareceu sem máscara. Estava doente e não respeitava as regras ou não estava doente e inventou-se tudo isto para, mesmo que não vacinado, pudesse entrar na Austrália? Não se sabe ao certo, mas a atitude dele faz levantar as maiores suspeitas e parece indicar que há regras para o cidadão comum e outras para os ricos e poderosos.
Os “anti-vaxxers” rejubilam: Djokovic está livre e o seu sucesso é também o deles. Um tribunal disse que pode ficar em território australiano e agora deduzem que o tribunal de alguma forma validou a sua opção, e também a deles, em não se vacinar.
O problema da liberdade de Djokovic e dos “anti-vaxxers” é a sua oposição frontal à liberdade daqueles que não querem ser contaminados e acreditam, como acredita a esmagadora maioria dos médicos e cientistas, que a melhor arma que temos contra a doença é a vacina. Eles, que têm? Um acervo contraditório de superstições e uma amálgama de teorias da conspiração. Uns acham que não existe Covid-19, outros que existe mas é uma doença negligenciável, outros ainda que os que morreram de Covid-19 morreram afinal de outras doenças, outros acham que a vacina é desnecessária, outros que a vacina mata, ou é ineficaz, ou provoca autismo, ou é feita com partes dos corpos de fetos abortados, ou que serve para injetar um chip 5G nos vacinados e permitir o seu controlo remoto, etc., etc.
Não vale a pena argumentar com eles, assim como não vale a pena tentar explicar física quântica a um cavalo morto. Partilham entre eles informação espalhada por sítios da Internet de que ninguém ouviu falar e assim vão reforçando, com outras mentiras e com falsa informação, as mentiras em que acreditam.
Djokovic, como figura pública, como melhor jogador de ténis do mundo, tinha obrigação de dar o exemplo. Preferiu as teorias da conspiração e, para forçar a sua entrada no Open da Austrália, as aldrabices. Pode ser um campeão, mas é um cretino e um vigarista.
Passing shot
“Djokovic, como figura pública, como melhor jogador de ténis do mundo, tinha obrigação de dar o exemplo.”