O distrito da Guarda na mão dos partidos

“António Monteirinho recebeu o apoio maioritário das concelhias, impondo nomeadamente o argumento de que no concelho da Guarda vivem mais de um quarto dos eleitores do distrito, mas os deputados do PS têm sido de outros concelhos (Gouveia e Seia) com uma clara menorização da capital de distrito”

A poucos dias do limite de entrega das listas (dia 20) são já conhecidos a maioria dos nomes dos constituintes das candidaturas. Perante a limpeza que os dois maiores partidos fizeram, muitos dos rostos mais conhecidos do parlamento foram excluídos. A qualidade parlamentar e o nível do debate democrático poderão descer sobremaneira, comparativamente a anteriores mandatos, mas é também uma enorme renovação, sobre a qual ainda é cedo para percebermos se há melhoria ou não da competência política. Mas, para já, a perceção é de que as listas do PS e do PSD são o reflexo de escolhas de lealdade e obediência ao chefe. António Costa e Rui Rio afastaram todos os que no seio dos maiores partidos exibiram discordância do líder.
Mas também há uma renovação natural, resultado do “esgotamento” de alguns ou das circunstâncias próprias da política. A ditadura da demografia implica que o despovoamento vai reduzindo representatividade aos distritos com menos eleitores e distritos como o de Castelo Branco (que ainda elege quatro deputados) ou da Guarda (que elege apenas três) têm cada vez menos representantes.
Em Castelo Branco, o PS afastou naturalmente Hortense Martins, depois de anos de domínio absoluto da organização a nível distrital. Os negócios do marido, e antigo presidente da Câmara de Castelo Branco, afastado do poder pelo tribunal, levam à queda de Hortense e ao apoio incondicional do PS a Ana Abrunhosa, que deverá manter o apoio eleitoral maioritário do PS naquele distrito.
Na Guarda, o PS “naturalmente” repete Ana Mendes Godinho como cabeça de lista e a surpresa é o afastamento de Santinho Pacheco, depois de anos de vida política e partidária – a exigência de Lisboa de o seu nome ir a votos ditou esse desfecho. António Monteirinho recebeu o apoio maioritário das concelhias, impondo nomeadamente o argumento de que no concelho da Guarda vivem mais de um quarto dos eleitores do distrito, mas os deputados do PS têm sido de outros concelhos (Gouveia e Seia) com uma clara menorização da capital de distrito. Por outro lado, e depois da hecatombe socialista nas últimas autárquicas, em que Monteirinho foi o terceiro da candidatura socialista, o PS premeia os maus resultados do PS e confia que António Costa recuperará as simpatias dos eleitores socialistas da Guarda – talvez até apoiar e dar passadeira a uma putativa candidatura do ainda presidente da concelhia à Câmara da Guarda em 2025 e uma “resposta” ao PSD que leva João Prata como segundo. O Partido Socialista investiu muito na recuperação da Guarda sem sucesso – tanto que criou na cidade uma secretaria de Estado, com o argumento de “descentralizar”, mas que na verdade pretendia mostrar serviço “público” e fazer trabalho político: Rita Mendes nunca conseguiu reconhecimento ou dar visibilidade e relevância ao seu gabinete, nem justificar a existência de uma desconcentração de serviços inútil.
Do outro lado, sem surpresa, Gustavo Duarte depois de 12 anos à frente da Câmara de Foz Côa, e quando se preparava para regressar à sua vida empresarial, volta a concorrer à Assembleia da República (onde já esteve em 2002-2003). Rui Rio excluiu sem apelo nem agravo Carlos Peixoto dando o lugar a um indefetível do Alto Douro. O lugar chegou a estar previsto para Chaves Monteiro, mas a distrital fez saber à direção nacional que o ex-presidente da Câmara da Guarda continuava a dividir o partido e a escolha acabou por ser sensata: em primeiro lugar um deputado que sempre foi da linha do chefe e em segundo lugar João Prata, um apoio seguro, uma aposta nos eleitores da Guarda (onde o presidente da Junta de Freguesia sempre foi ganhador) e uma aposta no futuro: João Prata poderá vir a ser o candidato do PSD em 2025, caso, entretanto, não seja possível fazer a ponte com Sérgio Costa.
A Guarda só elege três deputados, mas “por um se ganha e por um se perde”. Quem eleger dois deputados levará clara vantagem. É provável que o PS seja o vencedor e António Monteirinho e Cristina Sousa acabem por ser deputados, pois, se Costa ganhar, Ana Mendes Godinho (a bem da nação) deverá continuar no governo. Mas o PSD aposta na possibilidade, depois de ganhar a maioria das camaras do distrito, ser o partido mais votado e, para isso, confia no peso eleitoral de João Prata na Guarda.

Sobre o autor

Luís Baptista-Martins

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