Sociedade

A arte do crochet que o confinamento despertou

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Escrito por Efigénia Marques

Maria José Martins é uma das muitas pessoas que se viu obrigada, com a pandemia, a arranjar um “hobby” para passar o tempo. O confinamento fê-la resguardar-se em casa e as filhas ofereceram-lhe um saco com imensos rolos de linhas para que se pudesse ocupar o tempo e o resultado foi agora revelado.
Natural de Aldeia do Bispo (Guarda), a regente escolar aposentada começou por fazer Nossas Senhoras de Fátima para oferecer às irmãs no Natal de 2019. Na altura, fez também um presépio para cada uma das filhas, para o neto e para si, este último «muito completo, com os três reis magos», lembra. E como linha puxa linha, Maria José Martins decidiu continuar a criação de figuras, «nomeadamente São José», tendo acabado por se «entusiasmar» com esta arte. «Como gosto muito da minha aldeia, comecei a recordar as zonas públicas, os hábitos e os costumes que outrora existiram em Aldeia do Bispo. Cada vez fazia mais, e cada vez me lembrava de mais coisas e assim cheguei a estas peças todas», explica a O INTERIOR.
Atualmente com 81 anos, o crochet é «uma paixão» que começou na adolescência: «Desde pequena que gosto de bordados, com 15 anos fiz alguns trabalhinhos e até fiz o meu enxoval todo. Mas depois, pelas circunstâncias da vida, houve um interregno em que parei com as rendas, o crochet, porque já tinha o suficiente e comecei a fazer costura, vestidos para as minhas filhas e fatos para mim. Com a reforma comecei a fazer toalhas de renda, mas é o crochet que mais me fascina», admite. Quanto às peças que recriam Aldeia do Bispo, Maria José Martins fez questão de representar alguns edifícios específicos como a escola, «onde aprendi a instrução primária e onde, aos 26 anos, dei aulas». Lá está também o forno comunitário, «onde toda a gente ia cozer o pão», o centro de dia «de que muito me orgulho e onde estão os idosos», o museu e algumas casas antigas em granito. «Também bordei moradias com arquitetura mais atualizada, porque agora já lá há muitas casas novas», o que resultou numa recriação do antigamente misturado com o atual.
«Fiz a igreja onde eu fui batizada, onde me crismei, onde me casei há 55 anos e, claro, lembrei-me também de fazer o senhor padre, os noivos a sair da igreja. Fiz a Capela da Santa Cruz, que é muito importante para nós e fiz ainda até a minha casa da aldeia», que foi herdada dos pais, descreve, orgulhosa, a antiga regente. Apesar de agora viver em Celorico da Beira, Maria José Martins gosta «muito» da sua terra natal, onde ainda tem casa e gosta de ir passar um domingo. «Mas a minha aldeia nunca me esqueceu e isto foi quase recordar os meus tempos de mocidade e reviver os hábitos daquela altura», adianta. Entre as peças criadas também estão representadas algumas das profissões e costumes que entretanto foram desaparecendo, como as lavadeiras, o picanço de «onde se tirava a água», a mulher da lanha, a ceifeira…
A igreja e a escola são, talvez, as peças pelas quais Maria José Martins tem mais carinho, enquanto a que levou mais tempo foi a Capela da Santa Cruz, que «demorou uma semana devido a todos os pormenores que tem», revela. «Durante o confinamento isto foi uma terapia para mim porque não se pensa em dores, nem em mais nada, porque distraio-me do resto», afirma. Concluído e revelado este trabalho tão meticuloso, o “feedback” dos conterrâneos tem sido «muito bom» e a sua autora já recebeu telefonemas «da Alemanha, Suíça, França e Brasil». Fruto desse orgulho dos conterrâneos, está prevista uma exposição das peças no museu da aldeia próxima da Guarda. Já quanto a aumentar este trabalho, Maria José Martins confessa que «a idade já é muito avançada e não tenho muito espaço – agora preciso de uma redoma para as peças não apanharem pó –, então quase que me limito a isto».

Carina Fernandes

Sobre o autor

Efigénia Marques

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