Oito Câmaras da região rejeitaram a transferência de competências do Estado, seis aceitaram algumas e apenas a Covilhã deliberou assumir as onze competências que a administração central que transferir para as autarquias.
Mas o assunto não foi pacífico na Assembleia Municipal, com a maioria socialista e a oposição a divergirem na argumentação. A deliberação foi aprovada por maioria, com os votos a favor do PS e contra dos eleitos do CDS-PP, CDU, PSD e do movimento independente “De novo Covilhã”, registando-se uma abstenção. Assim, a Câmara da Covilhã será a única em 2019 com competências nas praias, jogos de fortuna ou azar, vias de comunicação, atendimento ao cidadão, habitação, património, estacionamento público, bombeiros voluntários e justiça, promoção turística e fundos europeus. Na sessão, Vítor Pereira afirmou que avançar imediatamente para a descentralização é uma «oportunidade» porque dará tempo à Câmara para se adaptar à nova realidade, que, «quer se queira quer não», será obrigatória em 2021. «Este período transitório pode ser aproveitado para ir percorrendo o caminho, fazer ajustamentos e corrigir trajetórias», justificou o presidente do município.
Em termos de financiamento, o edil socialista sublinhou que há competências que já são «total ou parcialmente» assumidas pela Câmara, que há outras que não envolvem qualquer montante e que nas restantes os respetivos «envelopes financeiros» terão de ser negociados com a autarquia. Opinião diferente partilhou Vítor Reis Silva (CDU), que acusou Vítor Pereira de estar a «obedecer às orientações do Governo e do PS de forma irresponsável e sem acautelar os interesses do concelho». Por sua vez, João de Deus (PSD) invocou a falta de informação e as «falhas existentes» no processo para não votar favoravelmente. «Queremos uma verdadeira descentralização, bem feita e adequada. Não defendemos uma lei pouco clara, complementada por diplomas com tantas falhas que não deixam perceber o que verdadeiramente está a ser oferecido», disse. Para o centrista João Vasco Caldeira, esta decisão foi «um frete ao Governo e um péssimo serviço a quem nos elegeu» e um «salto no desconhecido», enquanto Luís Fiadeiro (“De Novo Covilhã”) criticou que o processo e o impacto financeiro não tenham sido devidamente «ponderados, pensados ou estudados», classificando a transferência de competências de «autêntico logro».
Envelopes financeiros em falta
A Assembleia Municipal de Figueira de Castelo Rodrigo voltou a favor da aceitação de quatro competências do Estado nas áreas da exploração das modalidades afins de jogos de fortuna e azar, bombeiros voluntários, habitação e estacionamento público. A transferência das restantes foi rejeitada por unanimidade. Em Celorico da Beira, a AM aceitou a transferência de três competências na exploração das modalidades afins de jogos de fortuna ou azar e outras formas de jogo, praias fluviais e gestão do património imobiliário público. O autarca Carlos Ascensão (PSD) adiantou que o executivo só tinha aceite, por maioria, a competência da gestão do património imobiliário público. As restantes foram rejeitadas «sobretudo pelo envelope financeiro e por um conjunto de indefinições que ainda existe», referiu o autarca. «O Governo atrasou-se e foi um pouco como decidir no escuro», considerou Carlos Ascensão.
Já o município de Foz Côa rejeitou a delegação de competências por não haver envelope financeiro adequado ao processo. «Não somos contra este princípio do Governo. O que queremos é um envelope financeiro que acompanhe esta delegação de competências e o processo terá de evoluir de outra forma», admitiu Gustavo Duarte. O edil social-democrata adiantou a transferência de competências foi rejeitada por unanimidade no executivo e por maioria na Assembleia Municipal. Em Almeida, a AM aceitou, por maioria, a transferência de competências na gestão do património imobiliário público, gestão de lojas do cidadão e de espaços do cidadão, praias fluviais e exploração das modalidades afins de jogos de fortuna ou azar e outras formas de jogo. «A Câmara recomendou à Assembleia Municipal não aceitar as restantes competências pelas dúvidas que ainda há relacionadas com o pacote financeiro e com o seu funcionamento», disse o autarca António José Machado (PSD).
Aumento da despesa municipal
Em Manteigas, todas as competências foram rejeitadas pela AM, por unanimidade. «O município deliberou não aceitar nenhuma porque queremos dar passos seguros. Somos a favor da descentralização, a questão é que não é claro o acompanhamento financeiro e achámos que devíamos dar algum tempo para saber o que o Governo vai dar», justificou Esmeraldo Carvalhinho. O presidente socialista justificou que a autarquia não pode correr «o risco de originar instabilidades financeiras». A mesma decisão foi tomada no concelho vizinho de Gouveia, cuja AM decidiu, por maioria, rejeitar a transferência de competências com o argumento de que «estas decisões e deliberações sempre teriam – e terão – uma importância decisiva para o futuro do município e para a suas gerações vindouras, nada aconselhando, pois, que as mesmas sejam adotadas de modo precipitado». Além disso, implicariam «sempre, e de forma imediata, um aumento da despesa municipal», que não está calculada neste momento.
Também Belmonte rejeitou por unanimidade a transferência de competências em 2019. «Decidimos rejeitar porque queremos ter mais tempo para ponderar e porque queremos estar mais a par do pacote financeiro que vai acompanhar esta descentralização, que, por enquanto, ainda desconhecemos, declarou António Dias Rocha (PS), destacando que algumas competências podem ter «impactos financeiros relevantes» nas contas da autarquia. Ressalvando que não é contra a descentralização de competências, o autarca acrescentou que a Câmara de Belmonte não poderia aceitá-las sem saber «claramente o que está em cima da mesa». Em Fornos de Algodres a AM aprovou seis competências, nomeadamente nas praias fluviais e património imobiliário do Estado. Já Pinhel aceitou competências no estacionamento público e nos jogos de fortuna ou azar. «Não somos contra, pelo contrário, somos a favor da transferência de competências para as Comunidades Intermunicipais e para as autarquias locais. A intenção do Governo foi boa, o problema é a forma, na medida em que as propostas de transferências não vêm devidamente acompanhadas dos necessários envelopes financeiros», afirmou o presidente Rui Ventura.
Descentralizar com «cabeça, tronco e membros»
Na Guarda, depois da Câmara ter aprovado aceitar três competências, a AM deliberou no mesmo sentido e deu luz verde a transferências no domínio da habitação, atendimento ao cidadão e da gestão do património imobiliário público por não envolverem custos, nem mexidas na orgânica da autarquia. E na Mêda a opção foi recusar qualquer transferência porque «há falta de esclarecimentos e de alguma informação que nós achamos necessária», adiantou Anselmo Sousa. O edil socialista especificou que a rejeição «não foi tanto pelo pacote financeiro, mas por falta de informação». O processo também não passou em Trancoso, cuja AM rejeitou, por maioria, a transferência de competências. «Não estavam reunidas as condições para aceitar, sobretudo a nível financeiro», sublinhou Amílcar Salvador, para quem a descentralização tem que ser feita «com cabeça, tronco e membros». Além disso, o autarca acrescentou que é necessário «as Câmaras apetrecharem-se, em termos de recursos humanos, para assumirem essas competências».
O Sabugal rejeitou igualmente a transferência de competências em 2019, «essencialmente pela indefinição relativamente às questões concretas de financiamento e de tarefas», disse António Robalo. Para o autarca social-democrata, este não foi «um processo sério», daí a decisão de não aceitar, nesta fase, qualquer transferência de competências do Estado. «Desconhece-se o conjunto de implicações financeiras, humanas e organizacionais, que a aceitação de tais competências irá acarretar para o município, bem como as matérias a transferir e as suas implicações nos vários serviços públicos concelhios», especificou. Em Aguiar da Beira a opção foi declinar qualquer competência porque «falta o envelope financeiro e, acima de tudo, pela questão do quadro de pessoal, dos recursos humanos, e pela parte logística», sustentou o independente Joaquim Bonifácio. O presidente da Câmara adiantou que não é contra a descentralização: «Queremos é ser devidamente esclarecidos e saber com o que contamos para decidir», acrescentou.