Leio a imprensa para estar a par do que mais importante se passa no mundo e fico a saber que a primeira vacina da Covid-19 foi dada a uma senhora inglesa de 90 anos, às 6h31. Nem queria acreditar na notícia. 6h30 da madrugada? Esta senhora pode ficar livre do coronavírus, mas não se livra que a acordem a meio da noite.
Reconheço nesta situação o meu privilégio de pessoa que não pertence a nenhum grupo de risco e, por isso, não serei chamado para tomar a vacina ainda antes do nascer do sol. A senhora inglesa claramente foi discriminada por causa da sua idade. Tivesse ela menos 40 anos e ninguém se lembraria de chamar uma pessoa adulta para levar uma vacina às seis e meia da manhã. Como é bastante velha, os enfermeiros acham que a senhora adormece antes de terminar e Telejornal e que precisa de estar em casa cedo para começar o almoço.
Felizmente, o plano de vacinação para Portugal não prevê vacinas às 6h30 da manhã. Talvez comece um pouco mais tarde. O mais certo é ser depois das 9, ou depois de almoço, ou passado uma semana, ou no mês seguinte.
Leio também que o segundo tomador da vacina foi William Shakespeare. Não há relatos que tenha dito «o meu reino por uma dose», nem «ser ou não ser vacinado, eis a questão». Este Shakespeare tem apenas 81 anos, mas ao contrário do seu homónimo seiscentista, toda a gente sabe que foi ele que levou a vacina, portanto, não haverá lugar a debates intermináveis sobre quem realmente levou a dose onde estava escrito o nome William Shakespeare.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia