Como aquelas doenças incuráveis, o tema do encerramento da maternidade da Guarda volta a preocupar os habitantes do nosso distrito. O novo ministro da Saúde ameaça a Guarda e outras regiões dos chamados territórios de baixa densidade com o encerramento de maternidades. Recordamos, aos mais distraídos, que parecem ser cada vez mais, que há uns anos houve uma luta de médicos do Hospital da Guarda contra a hipótese de encerramento da maternidade. Lembram-se que houve médicos a serem multados em mais de 33 mil euros por escreverem ao primeiro-ministro – exatamente a propósito da maternidade – em papel timbrado do hospital? E que até houve despedimentos ilegais? E que, por causa desse conflito, houve condenações criminais de membros da administração da ULS? E que por essa altura ocorreu a tentativa de Carlos Pinto, presidente da Câmara da Covilhã, de lançar a estapafúrdia ideia de um hospital central naquela cidade? E que o atual ministro da Saúde, à data secretário de Estado, apadrinhou publicamente essa ideia?
Pois bem, recentemente, um deputado eleito pelo PS à Assembleia da República, que por sinal foi membro do Conselho de Administração da ULS, veio dizer esta coisa fantástica de que «se o Hospital da Guarda não é hospital central não pode ter todas as valências»! A sua notória preocupação em, à custa da Guarda, preparar o caminho para ficar bem na fotografia partidária e poder assim ascender a cargos mais altos, dispensava-se. É que nós não precisamos mesmo de políticos com valências discursivas deste quilate! A queda da maternidade, a acontecer, arrastará, a prazo, várias valências, e poderá colocar em causa a própria urgência médico-cirúrgica, a tal que até já é cada vez mais “fake”, com buracos regulares em tudo quanto é escala de especialidade. Recordam-se de um candidato a primeiro-ministro de Portugal afirmar um dia, na Guarda, que «Um cidadão da Guarda tem de ter os mesmos direitos que um cidadão do litoral»? Pois bem, os nossos direitos caminham na razão direta da vergonha e da palavra desta gente, ao ponto de uns e
outros, nós e eles, não termos nada para mostrar. Nem direitos, nem vergonha, nem palavra! No dia em que o nosso hospital estiver definitivamente reduzido a uma espécie de centro de saúde, talvez os políticos locais compreendam que andaram afinal a pelejar uns com os outros para serem o equivalente a um macho alfa de um harém que já não existe!
A ULS da Guarda é cada vez mais uma central de transporte de doentes para outras instituições, gerida por gente completamente enfeudada às diretrizes partidárias. Eles primeiro, depois o partido, e, por fim, tudo o resto! Com gente desta, o atual ministro da Saúde, cujos amores pela Covilhã vêm de longe, nem precisa de se esforçar muito para nos dar cabo do hospital…
Esperar que um ministro desses receba o representante dos munícipes e que isso tenha alguma influência no desfecho deste dossier é o mesmo que julgar que as raposas castanhas são melhores do que as raposas cinzentas para governarem o galinheiro!
A estratégia dos poderes instalados e dos partidos com representação na Assembleia da República passa por ser a de compensar com propaganda e demagogia as promessas não cumpridas. Todas as promessas de requalificação e conclusão das obras no hospital da Guarda não passam mais uma vez de tristes ilusões. Quantas vezes os cidadãos da Guarda já foram e são enganados? Ficarem submissamente agradecidos com obras de fachada que não terão qualquer resultado prático para as populações é, mais uma vez, atirar dinheiro pelo cano de esgoto. Onde haverá população para usufruir de tais megalómanos projetos? Retirar às populações a possibilidade de terem um serviço de saúde consentâneo com as suas necessidades é um convite ao abandono das terras que ainda vão sendo ocupadas por resistentes e resilientes. Pensar-se que uns nómadas digitais são a solução para o problema do despovoamento é mais uma ilusão imbecil. Mesmo os ditos nómadas, que desenvolvimento não acrescentam à região, exigem condições de saúde eficazes. Mesmo que tenham rios de dinheiro, vindos sabe-se lá de onde, que possam pagar serviços no sector privado da saúde, conduzem, indubitavelmente, à falência do sistema público de saúde, o único que os portugueses conseguem pagar dados os parcos rendimentos que usufruem. Deus tenha piedade de nós…
Promessas, trafulhas, desgraças e quedas
“A queda da maternidade, a acontecer, arrastará, a prazo, várias valências, e poderá colocar em causa a própria urgência médico-cirúrgica, a tal que até já é cada vez mais “fake”, com buracos regulares em tudo quanto é escala de especialidade.”