Andamos todos alarmados com o envelhecimento da população e o inverno demográfico, ao mesmo tempo que nos abeiramos do pânico quando chegam o verão e os incêndios. A acontecer o que se prevê, quase consensualmente, teremos dentro de poucas décadas a Península Ibérica como prolongamento do Sara e, como habitantes, uma maioria esmagadora de velhos. Precisaríamos de gente jovem, dizem, para enfrentar a crise climática e não a vamos ter.
Há quem encare a atual situação de maneira muito diferente, para melhor e para muito pior. Começo pelas más notícias e estas dizem-nos que já não é possível reverter o aquecimento global. É tarde de mais. Por muitos carros elétricos ou híbridos que passem a circular nas estradas, por muita regulação do mercado de carbono, por muitas árvores que se plantem, agora há que enfrentar a realidade: a temperatura vai continuar a subir, as calotes polares e os glaciares vão continuar a encolher e os fenómenos meteorológicos extremos vão passar à banalidade. Por isso, dizem alguns, em vez de procurar evitar o inevitável é melhor começar a preparar o futuro e essa vida com invernos mais curtos, verões mais quentes e secas prolongadas. É claro que se devem continuar a combater os gases com efeito de estufa, mas devemos preparar-nos para viver normalmente num mundo muito diferente.
Já as questões da população devem ser vistas de mais longe, à escala planetária. A verdade é que se falta gente, sobretudo gente nova, na Europa Ocidental, sobra no hemisfério sul e na Ásia. Mais de 7.700 milhões de pessoas (estimativas de abril de 2019) é quase o dobro das que havia em meados dos anos 70 do século passado. Em boa parte do hemisfério norte o crescimento populacional estagnou, mas mesmo assim há demasiados seres humanos para a capacidade do planeta, para os recursos naturais disponíveis. No nosso país fala-se de um declínio populacional acentuado para o futuro, mas há quem diga que ainda bem. Outra questão é a falta de jovens, a crise previsível da Segurança Social, a necessidade de reorganização social que toda esta nova realidade implica.
Por isso, se há uma crise demográfica no planeta, não é a do envelhecimento das sociedades ocidentais, é a do crescimento populacional desregrado em vários outros pontos do globo. Este crescimento está a provocar surtos migratórios para norte e a inspirar aí discursos populistas e xenófobos. Os ingredientes estão na mesa e os cozinheiros não só não são de confiança, como parecem não estar a perceber nada do que se passa.