Se, de imediato, um qualquer português tivesse de debitar o que sabe sobre a cidade da Guarda, na melhor das hipóteses, diria que é uma cidade do interior, a mais alta de Portugal e conhecida pelos seus cinco efes. No entanto, o passado recente pode alterar essas primeiras impressões. Ninguém a reconhecerá ainda pelo sabor dos seus D. Sanchos, ou pela peculiaridade das suas rotundas, mas sim pela capacidade que as pessoas ganham para cometer ou dizer parvoíces sem influencia de álcool ou drogas.
Os efeitos nefastos da altitude não serão suficientes para justificar tamanhas alarvidades, mas, desde a condecoração de Zeinal Bava, num 10 de junho de vaga memória para Cavaco Silva, que há uma certa originalidade non sense, particularmente nas declarações de membros do Governo, consecutivamente convidados para festas e inaugurações.
Recentemente, o secretário de Estado da Energia, João Galamba, afirmou que os habitantes do interior devem ajoelhar-se perante os avultados investimentos da EDP e agradecer-lhes a luz que os livra do breu e do cheiro do petromax, consumindo-a desenfreadamente, já que ela é barata. Passadeiras LGBTI turbo pintadas e iluminadas com luzes de halogéneo, com todos os quartos de luz acesa para alimentar o papão, é o mínimo que podemos fazer para agradecer.
Pedro Siza Vieira, ministro Adjunto e da Economia, veio agora à Guarda inaugurar um certame turístico e dizer que as portagens não desencorajam o turismo. Não fosse o Canal Parlamento com as suas comissões de inquérito uma fonte de pagode inesgotável e estas afirmações assumiriam outra relevância cómica. Pedro Siza Vieira foi uma espécie de André Ventura, dizendo alto o que as pessoas dizem nos cafés… “queres ir à Guarda? Então paga!”
Numa altura em que o princípio do utilizador pagador é totalmente subvertido, particularmente nas áreas metropolitanas, temos alguém que vem a custo zero dizer-nos que se não temos mais turistas é porque eles não querem vir. Porque ter o preço por quilómetro mais caro do país, em autoestradas com troços que verdadeiramente não o são, com alternativas destruídas para as construir, ou demorando mais tempo que qualquer viagem na década de 80, conhecendo as irregularidades do piso de paralelos de dezenas de localidades, claramente não afasta ninguém…
Só um novo 13 de maio ou uma reviravolta ao estilo Liverpool e Tottenham nos pode exorcizar deste pesado fardo que claramente não é de reversão prioritária para o poder central. Enquanto vamos tendo a visita de ursos pardos, que cobiçam os potes do mel cada vez mais depauperados, o território será cada vez mais dos lobos e javalis. Uma grande reserva de caça que fará as delícias de poucos, que não sentirá a falta da inoperância do satélite do SIRESP ou da greve dos camionistas de matérias perigosas.
Não conseguindo estancar a sangria populacional, perdendo influência e massa crítica, não espanta que muitos olhem para estas eleições europeias como algo distante, num discurso que vezes demais se confunde com umas pré-legislativas. Com o nível de abstenção esperado, o sentimento de muita gente é exatamente o mesmo da música de um dos cabeças de cartaz da semana académica, Deejay Télio: https://www.youtube.com/watch?v=SwfgTQnxmaY&list=RDEMLpkV6OuZSl33LclOgf9_ww&index=1