O problema é do mano. Tu não sabes porquê, mas o chefe que é teu parente engendrou sozinho esta patranha. Viu que lhe davam seguro, viu que o seguro era melhor que o lucro das vendas, vinha aí o verão com dois salários para pagar, percebeu que o futuro era incerto, já tinha no bolso os incentivos do Estado para a montagem da fábrica, fez as contas e decidiu: primeiro mostrou as parcas encomendas e conseguiu que a malta se aquietasse em casa. O povo gosta de ganhar estando em casa, mas não faz contas a que o salário não chove nem troveja. Depois, numa noite de sábado levou a maquinaria, que vendera entretanto. Os trabalhadores regressaram e entraram na nave. Ora porra! ouviu-se, e o eco levou a porra mais alta e mais longe. Já viste isto? Gritava uma das mulheres dos teares. O choque cresceu e na sua combustão chegou a revolta, vieram as TV’s, apareceram os jornalistas, chegaram as famílias em combustão emocional. Foi uma reportagem de glória. O povo chorava, o povo gritava, o povo ruborizado. A fábrica escancarada mostrava-se nua.
O tipo levou tudo daqui – gritou alguém, agarrando-te na camisa. O mano não fazia isso!, disseste antes do primeiro murro. Depois soubemos que também te tinha roubado a ti. Só muitos dias depois percebeste que o mano era um bandalho que te ficara com tudo e fugira.
O problema não é a crise, não é a política, é o modo como alguns se comportam na adversidade e quando são possuídos da ganância.