O efeito ferradura nos argonautas do mar Tirreno

Escrito por Albino Bárbara

“É tempo de percebermos (todos nós, políticos incluídos) que a demagogia (mesmo aquela feita à maneira) tem os dias contados. Os chico-espertos do sistema socorrem-se dos sábios ditames populares “enquanto vai o pau e não vem folgam as costas”.”

O efeito ferradura determina que os extremos tocam-se e estão entre si muito próximos mantendo igual distância do centro político, sendo que de um lado fica Sodoma e do outo Gomorra. Será assim?
Na semana passada o governo espanhol, liderado pelo socialista Pedro Sanchez, enfrentou duas moções de censura: uma apresentada pelo antifascista, combatente do regime falangista e comunista Ramon Tamames. A outra, pelo partido de extrema-direita Vox. Curioso, ou talvez não, foi ver Ramon Tamames e Santiago Abascal sentados lado a lado, utilizando a mesma técnica e a mesma linguagem. C’os diabos… afinal o efeito ferradura existe mesmo.
Por cá, no país dos brandos costumes, que aos poucos se está habituando às provocações parvas entre Belém e S. Bento, assistimos a mais uma reunião da Comissão de Revisão Constitucional onde o ziguezagueante PSD pretendia proibir as ideologias consideradas totalitárias fazendo uma associação entre o nazismo e o comunismo, numa de agradar e ser simpático para com o escarro que a democracia deixou parir ou numa de um populismo de conveniência.
Numa análise a este fenómeno das sociedades modernas as perguntas são inevitáveis: o populismo é positivo ou negativo? Seve quem? Os bazófias do sistema que estão contra o sistema? Dos que afirmam não precisarem da política e vivem dela? É de esquerda ou de direita?
Pois bem, numa pequena reflexão acerca desta matéria convém dizer que a defesa do povo é uma constante mesmo que para tal se apresente um programa difuso, incendiário, onde as emoções vêm ao de cima, são mais que muitas e o palavreado utilizado muito rudimentar, é agradável de ouvir e, os chavões empregues, como a frustração, raiva, desilusão, medo, vergonha, pobres, ricos, bons, maus, excluídos, merecedores, nós, vós, eles, investidores, corajosos, culpados, bodes expiatórios, vítimas, alimentam os sentimentos dos mais incautos, nesse choque cultural de todos os medos e terrorismos, onde as realidades são avivadas e o discurso do senso comum não traz ao de cima nenhuma deliberação racional.
Dizer ao povo o que o povo gosta de ouvir (o povo é quem mais ordena e a classe política é uma corja de oportunistas e corruptos), agradar às massas, satisfazer as suas vontades e necessidades, aproveitar as carências num espelho de ações passadas, de efeitos presentes e apostar num futuro que, afinal, só a Deus pertence, tem seguidores imediatos. A história identifica uma série de personagens que souberam e sabem utilizar a verborreia de todas as frases feitas para concluírem que o rei vai nu.
Este paradoxo da democracia onde são visíveis formas estereotipadas e redundantes alastra liderado pelo déjà vu da politiquice e banalidade cultural e por uma fraca argumentação que um dia foi protagonizada pelo general La Palisse. É tempo de percebermos (todos nós, políticos incluídos) que a demagogia (mesmo aquela feita à maneira) tem os dias contados. Os chico-espertos do sistema socorrem-se dos sábios ditames populares “enquanto vai o pau e não vem folgam as costas”.
É bem verdade que as dificuldades existem, mas o canto da sereia do mar de Tirreno, para marinheiros de água doce, irá um dia destes ser contrariado pelos argonautas da lenda de Odisseu e, se o azeite e água se misturam temporariamente, haverá sempre uma linha de separação entre a realidade e a ficção até porque o efeito ferradura existe. Os extremos (quase) se tocam e a distância para o centro partindo da esquerda ou da direita é precisamente o mesmo. E quanto a isto não há volta a dar…

Sobre o autor

Albino Bárbara

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