O início desta campanha eleitoral tem revelado uma crença praticamente unânime entre todos os líderes partidários: o inferno está a chegar. Ora o inferno é a instabilidade, ora o inferno é a maioria absoluta. Para uns, é o inferno do socialismo, para outros, o inferno do liberalismo. Há quem anteveja o inferno no tribunal, quem se preocupe esteja na escola, e quem ache que o inferno chegou no canil. Nitidamente, a política portuguesa é existencialista – o inferno são os outros partidos no poder.
Claro que, na formulação de Sartre, esta frase indiciava a responsabilidade pela liberdade na relação com os outros. Ora, responsabilidade pela suas acções é um conceito que os políticos portugueses desconhecem. O inferno são os outros. Para António Costa, o inferno da economia portuguesa não é da sua responsabilidade. É da Assembleia da República, dos países bálticos, e (ficámos a saber no debate rodízio de segunda-feira) da história.
Os partidos mais à direita têm criticado as políticas da geringonça com o argumento de que Portugal foi ultrapassado por quase todos os países da União Europeia que pertenciam ao antigo bloco comunista do Leste. O que a ala não-socialista não entende é que essa ultrapassagem é motivo de orgulho para a esquerda portuguesa, não de vergonha. “Olha, que lindos, foi o comunismo que os preparou para terem sucesso no capitalismo”. Ao contrário do que escreveu Marx, não é a abundância capitalista que prepara as sociedades para o comunismo, mas o socialismo da escassez que as deixa prontinhas para enriquecer. Aparentemente, é nesta fase da história que estamos.
* O autor escreve de acordo com a antiga ortografia