Na tentativa de prever como serão os próximos anos no que à evolução da Covid-19 diz respeito, os matemáticos, epidemiologistas e outros especialistas nas áreas da saúde e números lançam gráficos quase diariamente. São de toda a espécie, e muitas vezes, com pouco rigor matemático, que mais não fazem do que criar ruído.
Por estes dias de distanciamento social e devido ao constante “tropeçar” nestes gráficos, tenho refletido sobre como a numeracia, em toda a sua extensão, e não apenas em operações aritméticas, é essencial para o pensamento crítico acerca do que nos chega diariamente por diversos meios.
A matemática não deve apenas chegar na forma de números, tabelas ou gráficos, existem outras formas mais agradáveis de promover a numeracia, como seja através da arte.
Muito antes do desenvolvimento das imagens por satélite, o pintor do século XIX Vincent van Gogh, representava formações de nuvens em turbilhão nos seus quadros extraordinários. Embora as suas nuvens expressivas possam parecer ter pouca relação com uma panorâmica do céu vista da Terra, apresentam com efeito uma semelhança impressionante com as imagens da atmosfera terrestre que têm sido captadas por satélite. Na verdade, os padrões, as formas e as cores notáveis das imagens de satélite podem ser tão fascinantes como as obras-primas da arte moderna.
Nos últimos tempos, a denominada arte matemática tem ganho popularidade. Esta implica exprimir um resultado de um processo matemático com uma cor em vez de um número. Nalguns casos isto dá origem a imagens surpreendentemente semelhantes a formações espiraladas de nuvens, em especial as que são vistas do espaço. Os padrões em espiral também se encontram nas imagens de radar, onde são causadas pela reflexão das gotículas de água. Esta arte matemática gerada por computador apresenta um subproduto inesperado que se designa por geometria fractal, que emprega um número imenso de cálculos matemáticos, cujo resultado final é mostrado como uma cor localizada de maneira precisa num gráfico. O fractal é uma estrutura geométrica ou física e geralmente é muito similar em diferentes níveis de escala, porém nos fractais naturais essa característica é limitada em função da escala. O objeto é composto por partes reduzidas com formas semelhantes à dele próprio. O nome deriva do latim fractus, que significa quebrado ou fraturado. A dimensão de um fractal não é necessariamente um número inteiro, podendo ter dimensão fracionaria. A maioria não se enquadra nas definições tradicionais, e gera dúvida em relação ao comprimento, área e volume destas entidades matemáticas.
Anteriormente, era impossível produzir imagens desta natureza devido aos milhões de cálculos que seriam necessários. Um dos aspetos óbvios da geometria fractal é a sua semelhança com fenómenos de ocorrência natural, como nuvens e relâmpagos. Na geometria fractal, como na natureza, existem poucas linhas retas, e o ambiente é composto por inúmeras espirais, vórtices e remoinhos que são capazes de produzir uma tela de beleza e complexidade intrigantes. Estes fractais podem, também, ser encontrados em estruturas vegetais ou animais, como por exemplo, nas penas do pavão. Também na música a matemática tem influência, uma vez que se produzem sons e música a partir dos fractais.
Nestes tempos de incerteza, olhar para a natureza e encontrar nela lógica, coerência e perspetiva pode ajudar-nos a encarar o futuro com algum otimismo.