Não quis ir com quem não conhecia, não quis ir onde me esperava o desconhecido, não aceitei nada que me fosse estranho, nunca percorri estrada ao lado de quem não gostava, não me associei a quem me abria a mais pequena desconfiança. Fui sempre assim desta inoperacionalidade social, desta vertente desencontrada, procurando um prumo que me guiasse e me desse conforto. Claro que vivo só, não tenho filhos, não fico muito tempo num emprego. Claro que os amores foram vagos e curtos, pontilhados de desconfiados momentos.
Sempre fui desconfiado.
-Ela quer-me roubar! – Disse.
– A ti que não tens nada? – Disse-me o Amândio.
Só vejo isso agora. Claro que ela não queria nada de mim. Eu lavava-me pouco, arrumava menos, não tinha cão, nem gato, nem loiça, nem fogão. Era um tipo de ir ao restaurante do Padeiro, sempre o mesmo, sempre quando eu queria, sempre que sentia fome. Ela limpava o que via, arrumava. Eu desconfiei. Desconfiava de tudo e só mais tarde percebi que fiquei só porque estava doente. Hoje sei que sou doente e trato-me!
A realidade da vida é que há um padrão de fórmulas físicas, de relações de esgares, de palavras, de sorrisos, de aprovações e recusas, que ultrapassado ou não construído na regra prevista, nos coloca disfuncionais.
Somos uma panóplia de informações que nos faz pessoas e há pessoas que nunca o foram e não sabem. Espantadas entristecem quando estão sós. Eu sou assim, mas estou-me a tratar.
Não quis ir
A realidade da vida é que há um padrão de fórmulas físicas, de relações de esgares, de palavras, de sorrisos, de aprovações e recusas, que ultrapassado ou não construído na regra prevista, nos coloca disfuncionais.