Mulheres sem Nobel

Escrito por António Costa

“No discurso na cerimónia de Estocolmo, não fez qualquer referência a Martha Chase.”

Martha Chase, falecida em 2003, realizou a sua primeira experiência genética quando ainda estudava no College of Wooster, no Ohio. Aos 21 anos, começou a trabalhar no laboratório de Alfred Hershey em Cold Harbor Spring, no estado de Nova Iorque. Mal remunerada e insatisfeita, pouco meses depois de ter realizado a experiência que em 1953 impôs uma mudança radical na história da biologia molecular, Chase deixou o laboratório de Hershey para trabalhar durante breves períodos noutros organismos e completar finalmente o seu doutoramento na Califórnia, em 1964. Com um divórcio doloroso às costas e problemas com o álcool e o tabaco, tentou regressar a Cold Harbor Spring, mas sem êxito. A sua condição de mulher e a sua falta de saúde excluíram-na na carreira científica. Regressou com o pai ao Ohio, mas não voltou a casar nem teve filhos. Morreu depois de sofrer durante décadas de um tipo de demência com graves consequências para a memória. Em 1969, Hershey foi galardoado com o Prémio Nobel, em conjunto com Salvador Luria e Max Delbruck. No discurso na cerimónia de Estocolmo, não fez qualquer referência a Martha Chase.
A história trágica de Martha Chase não é tão conhecida como a de Rosalin Franklin, colaboradora do físico Maurice Wilkins no King´s College, de Londres, entre 1950 e 1953. Embora estivesse rodeada de pessoas que a estimavam, Rosalind não é descrita em termos especialmente cordiais pelos colegas mais próximos devido ao seu caracter difícil, direto e franco. Na correspondência privada de Wilkins, é mencionada pela pouco lisonjeira alcunha de “Dark Lady”, enquanto James Watson, no seu polémico livro “A Dupla Hélice”, lhe chama “Terrible Rosy” e descreve-a como «uma intelectualoide pouco feminina, despenteada e com óculos feios». Em contrapartida, as imagens de ADN de Franklin foram descritas como «as mais belas radiografias jamais conseguidas de uma substância». Em concreto uma delas, a fotografia nº 51, foi crucial para determinar a estrutura em hélice dupla da molécula. Wilkins mostrou a fotografia nº 51 a Watson e ao seu colega Francis Crick depois de a retirar do laboratório de Rosalind sem o conhecimento desta. Essa imagem e a elaboração matemática obtida pela cientista permitiram a Wilkins, Watson e Crick realizar o primeiro modelo de estrutura do ADN, a 7 de março de 1953, uma semana antes de Franklin deixar o King´s College. Depois de passar tantas horas exposta aos raios X no laboratório, Rosalind morreu com apenas 38 anos, de cancro do ovário, quatro anos antes de os seus três colegas serem distinguidos com o Prémio Nobel.

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António Costa

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