Memorial da Paz

“Ao visitarmos o Memorial em Vilar Formoso, homenageamos Aristides de Sousa Mendes, a Paz, o povo judeu, o povo palestiniano, Vilar Formoso, Almeida e os que em boa hora projetaram e construíram o museu Fronteira da Paz.”

Publicamos nesta edição uma grande reportagem sobre o polo museológico “Vilar Formoso – Fronteira da Paz, Memorial aos Refugiado e ao Cônsul Aristides de Sousa Mendes”.
Inaugurado há quase sete anos, numa excelente obra da Câmara de Almeida para perpetuar a memória de um tempo de guerra e sofrimento, de perseguição aos judeus, do nazismo, do Holocausto, da Segunda Guerra Mundial… Um tempo em que milhares de pessoas fugiram da Alemanha e de outros países ocupados, de refugiados que procuravam sobreviver ao terror que Hitler espalhava pela Europa. Um tempo em que o cônsul de Portugal em Bordéus, Aristides de Sousa Mendes, decidiu salvar milhares de pessoas, contrariando todas as instruções e assumindo todos os riscos, ao atribuir vistos aos refugiados que fugiam à procura de um local de abrigo. E chegaram de comboio a Vilar Formoso, a Fronteira da Paz, cuja hospitalidade histórica foi imortalizada neste Memorial.
Nesta reportagem procuramos mostrar o que o visitante pode encontrar neste retrato de vidas, de destruição, de sombras e sofrimento. Um local de histórias arrepiantes e conhecimento de um período negro da Humanidade. Mas também um local de esperança, de luz e de vida. Porque aqueles que o Memorial recorda são os refugiados de uma guerra e de uma perseguição atroz, de um povo marcado pelo acosso e angustiado pela perseguição, que ali foi acolhido por um povo hospitaleiro, com panelas de sopa e o conforto da paz.
Aristides de Sousa Mendes foi um herói improvável de uma guerra devastadora, carimbando vistos de vida; o povo de Vilar Formoso foi a mão amiga que deu de comer a desconhecidos em fuga. A pobreza de quem acolhia era uma riqueza imensa para quem chegava. Para quem há 80 anos chegou a Vilar Formoso e acalentava o sonho de viajar para a América e para a liberdade.
O Memorial que relatamos é um local de história, tristeza e esperança, mas sobretudo de visita obrigatória. Ali, ao lado da estação ferroviária de Vilar Formoso, nos antigos armazéns, brilhantemente transformados em polo museológico, que recebe visitantes de todo o mundo, descendentes de milhares de pessoas que ali despertaram para a vida fugindo das trevas. Um local onde as crianças, em visitas de estudo, percebem os horrores da guerra e do nazismo, e onde os beirões devem ir para sentir o orgulho de um povo hospitaleiro, o povo de Vilar Formoso e Almeida. Esta é uma reportagem que pode ler aqui, mas também pode ouvir na Rádio Altitude, que pretende mostrar uma obra notável de ciência e conhecimento, de cultura, museologia e arquitetura moderna, mas também homenagear o povo português que deu uma prova de humanismo naquele tempo tenebroso e homenagear as pessoas de Vilar Formoso que há 80 anos foram tão grandes que acolheram e partilharam nacos de pão e sopa para dar de comer a quem tinha fome.
Num momento em que em Gaza assistimos à traição de Israel à sua própria história, não podemos esquecer a história da Europa e da perseguição dos judeus pelo nazismo. Porque, como escreveu Miguel Sousa Tavares, estes israelitas que ocupam e destroem a Faixa de Gaza são «os traidores da memória do Holocausto e do projeto sionista», dos que fundaram o Estado de Israel. Os que matam em Gaza não são «os judeus vindos da Europa, África, Rússia, América, para então construírem um país novo sobre as areias do deserto, irrigando-o de água e agricultura, povoando-o de kibutzes que eram um modelo» que o mundo se habituou a admirar. Estes são os filhos, netos e bisnetos dos que foram salvos em Vilar Formoso e em tantos outros lugares do mundo, mas que esqueceram as desumanidades que o seu povo sofreu ao longo da história. E ao visitarmos o Memorial da Fronteira da Paz interpretamos as atrocidades a que são submetidos os povos subjugados, sejam os judeus salvos por Aristides de Sousa Mendes, que foram socorridos em Vilar Formoso e sobreviveram na sua passagem por Portugal, ou o povo palestiniano oprimido num campo de refugiados que é toda a Faixa de Gaza. Ao visitarmos o Memorial em Vilar Formoso, homenageamos Aristides de Sousa Mendes, a Paz, o povo judeu, o povo palestiniano, Vilar Formoso, Almeida e os que em boa-hora projetaram e construíram o museu Fronteira da Paz.

Sobre o autor

Luís Baptista-Martins

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